Luís Miranda (DEM) afirmou que presidente sabia que "tinha crime" na compra de imunizantes
O deputado Luís Miranda (DEM-DF) afirmou nesta quarta-feira (23) à CNN que levou pessoalmente ao presidente Jair Bolsonaro "provas contundentes" de irregularidades nas negociações para a compra da vacina Covaxin.
"O presidente sabia que tinha crime naquilo", disse o deputado. Miranda é irmão de um servidor do Ministério da Saúde que, segundo ele, teve conhecimento dos problemas. De acordo com o parlamentar, após o encontro, Bolsonaro ficou "convencido" e se comprometeu a acionar "imediatamente" a Polícia Federal.
"Entreguei a Bolsonaro. O caso não é só de pressão. É gravíssimo: tem desvio de conduta, invoice [nota fiscal] irregular, pedido de pagamento antecipado que o contrato não previa, quantidades diferentes", disse Miranda à CNN.
Miranda afirmou que decidiu ir ao presidente porque seu irmão, Luis Ricardo Fernandes Miranda, estava sofrendo retaliação por resistir a anuir com as tratativas. Ele já havia sido exonerado de um cargo de confiança e, segundo o deputado, só retomou o posto após o próprio parlamentar procurar diretamente o então ministro Eduardo Pazuello.
"Quando eu vi que o caso era grave e vi que poderiam ter pessoas envolvidas do alto escalão, fui direto no presidente. Fiz a pedido do meu irmão, que não confiava em ninguém e estava com medo", afirmou.
O dia do aviso ao presidente
Miranda disse que o irmão foi cobrado para acelerar a assinatura da nota fiscal das vacinas numa sexta-feira, dia 19 de março, às 23 horas. "Eu disse a ele, Luis: 'dorme e amanhã vamos ao presidente Bolsonaro, porque não sabemos mais em quem confiar'", afirmou.
De acordo com o deputado, o encontro com o presidente ocorreu no dia 20 de março, às 16h30. Miranda conta que ele, o irmão e a esposa, que ficou na antessala, se encontraram com o presidente e entregaram provas concretas: a cópia do contrato, a nota fiscal que seria fraudulenta e a comparação entre elas. "O presidente demonstra que se convenceu dos indícios de irregularidade, disse que ia encaminhar para o DG [Diretor-geral] da Polícia Federal para devidas providências".
Miranda disse que levou a Bolsonaro uma série de documentos para que não houvesse dúvidas sobre a acusação. "Relatos? Ele não ia acreditar em mim, não. Os amigos dele que estão lá dentro, ué. Levei provas contundentes. Ele [Bolsonaro] se convenceu e ficou de chamar o DG [diretor-geral da Polícia Federal]".
Entretanto, Miranda não recebeu retorno sobre o caso. No dia 23 de março, ele conta que enviou uma mensagem ao secretário-adjunto do presidente perguntando se ele estaria chateado.
"Eu defendo os policiais e o combate à corrupção, levo para pessoa eleita na mesma plataforma que a minha, não tinha motivo para o presidente não ter gostado da informação, estou protegendo nosso país", disse Miranda. O secretário teria respondido que não, que seriam muitas demandas e que relembraria Bolsonaro.
No dia seguinte, dia 24 de março, o deputado diz ter procurado o presidente novamente ao saber que as vacinas estariam próximas do vencimento e que, para dar tempo de importar, distribuir e vacinar a população com essas doses, "teria que fazer mágica". Miranda diz nunca mais ter conseguido contato com o presidente.
Pressão sobre Pazuello
O deputado disse também ter contado o então ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, sobre as irregularidades no dia 21 de março, domingo, em uma aeronave rumo a São Paulo para buscar vacinas.
"Ele disse que estava sendo espremido por problemas e que tinha certeza que seria exonerado", conta. Para Miranda, Pazuello foi "expulso do Ministério" por uma estrutura que o impediu de lutar contra a corrupção. "A estrutura o impediu de fazer o que era certo".
Corrupção e depoimento à CPI
Miranda afirmou que o grupo econômico encarregado das negociações para trazer a Covaxin ao Brasil já se envolveu em outros problemas no passado e que sua pauta é de "combate à corrupção".
"Qual a minha plataforma? Minha plataforma é segurança pública e combate à corrupção. Tem vários parlamentares que têm essa plataforma. Plataforma política, de vida, de tudo. Quem é o cara que tem a mesma plataforma que a gente e está no executivo? O Bolsonaro", afirmou.
O depoimento dos irmãos Miranda já está previsto na CPI da Pandemia. Senadores que compõem a comissão afirmaram à CNN que já foram avisados da disposição de Miranda de relatar as irregularidades e os avisos feitos diretamente ao presidente.
A CPI da Pandemia requisitou, no inicio da tarde desta quarta, segurança para o deputado Luis Miranda, ao irmão e aos familiares, de acordo com o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), integrante da comissão parlamentar.
Procurado, o Palácio do Planalto ainda não se manifestou. A CNN procurou também o Ministério da Saúde e o ex-ministro Eduardo Pazuello e aguarda retorno.
Em nota, a Precisa Medicamentos disse que as tratativas com o Ministério da Saúde seguiram todos os caminhos formais e de forma transparente. Sobre o valor da vacina, a empresa afirmou que foi o mesmo cobrado dos governos de outros treze países.
(Com informações de Bárbara Baião)