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 Nomes de peso da economia manifestam a maior insatisfação com Bolsonaro desde sua chegada ao poder. O agravamento da crise deve aumentar o afastamento

INDIGNADO Guilherme Leal, da Natura, diz que questionar as eleições é “totalmente inaceitável” (Crédito: Adriano Vizoni)

Por Marcos Strecker

O governo Bolsonaro perde popularidade em praticamente todos os segmentos e vê
suasustentação política evaporar. Mas, até o início do ano, ainda contava com a boa vontade dos empresários, que confiavam na agenda liberal de Paulo Guedes e na promessa de retomada econômica. Esse apoio sofreu fissuras desde o início do ano, quando ficou evidente que o descalabro na compra de vacinas iria frear a recuperação dos negócios. E o afastamento chegou a um ponto de quase ruptura com a escalada do governo contra as urnas eletrônicas.

“Essa escalada precisa acabar para que a gente volte a gerar renda” Fernando Pimentel, presidente da Abit (Crédito:Divulgação)

 Esse foi o duro recado transmitido pelo manifesto “Eleições Serão Respeitadas”,
lançado no dia 5 por empresários, banqueiros e economistas, que começou com centenas de nomes e em pouco tempo ultrapassou seis mil assinaturas. Não é comum a presença de grandes representantes do PIB no debate político, mas essa discrição foi superada pela urgência do momento. Guilherme Leal, fundador da Natura e copresidente do Conselho de Administração da empresa, mostrou ser uma das vozes mais indignadas. Ele considerou “totalmente inaceitável” que lideranças questionem a realização das eleições. “Essa escalada precisa acabar para que a gente volte a gerar renda”, defendeu o presidente da Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção (Abit), Fernando Pimentel. Fábio Barbosa, ex-presidente do Santander e da Federação Brasileira de Bancos (Febraban), notou que o manifesto “tem impacto por ser uma manifestação de empresários que normalmente não se manifestam”. Ele foi um dos coordenadores do
movimento, que começou com poucas dezenas de pessoas ligadas ao Centro de Debate de Políticas Públicas (CDPP) antes de ganhar a adesão massiva.

 “Os investidores daqui e de fora que querem apostar na retomada do País estão cada vez mais desconfiados” Eduardo Sirotsky Melzer, sócio-fundador da EB Capital (Crédito:Carol Carquejeiro)

O manifesto reuniu nomes de peso como Luiz Carlos Trabuco, presidente do Conselho de Administração do Bradesco, Pedro Moreira Salles e Roberto Setúbal (Itaú Unibanco), Luiza e Frederico Trajano (Magalu), Walter Schalka (Suzano), Ricardo Lacerda (BR Partners) e José Olympio Pereira (Credit Suisse Brasil). Em março, empresários já haviam divulgado um manifesto cobrando o governo por medidas efetivas de combate à Covid, que ficou conhecido como a “carta dos 500”. Mas, ao contrário dessa iniciativa, que serviu para forçar o governo a acelerar a compra de vacinas, o manifesto pró-democracia, lançado no mesmo momento em que o TSE e o STF passaram a tomar medidas concretas para conter as investidas antidemocráticas, não conseguiu conter a radicalização do governo. Depois que a PEC do voto impresso foi derrubada na comissão especial da Câmara, no dia 6, a matéria voltou ao plenário por pressão do presidente, que organizou um desfile de tanques para aumentar a pressão sobre os parlamentares na última terça-feira. Mesmo com uma nova derrota nesse dia, Bolsonaro voltou a levantar suspeitas sobre as urnas eletrônicas.

“Tenho arrepios, como boa parte do mercado, de ver esse arremedo de nacional-populismo crescendo no País” Daniel Goldberg, sócio da Farallon (Crédito:CLAUDIO BELLI)

Além da indignação com a ameaça antidemocrática, o combustível para a insatisfação é a percepção de que o governo Bolsonaro leva a economia a um impasse. Guedes já não consegue mais convencer que vai manter uma pauta coerente de respeito aos bons fundamentos econômicos, pois os programas eleitoreiros de Bolsonaro viraram a prioridade. A paralisia com as privatizações, o calote nos precatórios, a reforma açodada do Imposto de Renda, a pauta antiambiental e a crise energética que colocou o País na iminência de novos apagões são fatores que afastam os empresários dos braços do governo. Isso é sentido especialmente no setor de fundos de investimentos, que lida com as expectativas futuras e com a visão que players do exterior.

“Tenho arrepios, como boa parte do mercado, de ver esse arremedo de nacional-populismo crescendo no País. Essa combinação de blindados na rua, insinuações nas redes sociais e intimidação por meio de milícias digitais me lembra episódios tenebrosos do passado”, diz o empresário Daniel Goldberg, que é sócio da Farallon, uma das maiores gestoras de fundos do mundo, com US$ 20 bilhões em ativos. “Este governo ataca permanentemente as instituições democráticas, ao invés de endereçar os problemas verdadeiros e urgentes que o País enfrenta”, acrescenta Marcos Lederman, ex-diretor do banco Credit Agricole e sócio-fundador da JointVest. “Mais do que inadequada, a situação traz instabilidade ao Brasil, porque os investidores daqui e de fora que querem apostar na retomada do País estão cada vez mais desconfiados”, concorda Eduardo Sirotsky Melzer, da EB Capital, gestora com R$ 3,5 bilhões em ativos no País. A falta de paciência cresce. A perpetuação da crise em três frentes – institucional, sanitária e econômica – pode deteriorar ainda mais o ambiente de negócios e selar o divórcio do PIB com o presidente. Essa ruptura ainda não aconteceu, mas o tom do manifesto foi de ultimato. “O ano de 2022 já é uma zona de incerteza, com a alta da inflação, o desemprego, as preocupações fiscais e o Auxílio Brasil, que é mais um jeito de turbinar votos do que uma ajuda para quem precisa. A questão é que o que está em jogo não é mais a economia, mas a defesa da democracia”, resume Ana Carla Abrão, head do escritório da Oliver Wyman no Brasil.

Colaborou Vinicius Mendes

“O ano de 2022 é uma zona de incerteza. O que está em jogo não é mais a economia, mas a democracia” Ana Carla Abrão, economista (Crédito: Ruy Baron/Valor )


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