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 As manifestações de 7 de setembro mostraram um Jair Bolsonaro capaz de mobilizar as ruas, mas não de ampliar sua base de apoio, avaliam cientistas políticos.

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Segundo eles, os discursos do presidente nos atos devem esgarçar ainda mais a relação entre o Executivo e os demais Poderes da República, dificultando o avanço da agenda do governo e a probabilidade de reeleição.

Neste cenário, os analistas avaliam que todos os olhos estarão voltados para as reações do Congresso e do Supremo a partir desta quarta-feira (8/9). E acreditam que um processo de impeachment, até então improvável, não pode agora ser descartado.

"O fato de que Bolsonaro, com esse discurso golpista e criminoso seja bem sucedido em levar as pessoas para a rua é muito preocupante", considera a cientista política Carolina Botelho, pesquisadora do Mackenzie e da UERJ.

"Por outro lado, não se vê uma ampliação da base — são os mesmos 20% a 25% [da população] que vemos consolidado desde dezembro. É um grupo coeso, firme e que deve seguir com ele até 2022, mas não vejo probabilidade dessa base aumentar."

Essa é também a avaliação de Creomar de Souza, consultor de risco político e fundador da Dharma Politics. "Se o presidente queria uma foto para dizer que conta com apoio popular, ele conseguiu. A relação dele com seu próprio eleitorado parece bastante solidificada", diz o analista.

Souza destaca, no entanto, que esse núcleo duro é insuficiente para garantir a reeleição de Bolsonaro, considerando um cenário de normalidade, em que as eleições ocorram no próximo ano dentro das regras estabelecidas pelo jogo democrático.

"O presidente hoje tem uma dificuldade de tracionar, de falar para além da bolha. E eu creio que os atos desta terça-feira colocam ele mais dentro dessa bolha. Mas ele dá sinais de não se incomodar com isso e de não ter nenhum problema em constranger os outros entes institucionais para que o jogo seja jogado a partir das regras dele."

Num cartaz em inglês, manifestante pede a destituição dos ministros do STF no protesto em São Paulo
© AFP Num cartaz em inglês, manifestante pede a destituição dos ministros do STF no protesto em São Paulo

Agenda do governo ameaçada

Para o consultor de risco político, os protestos do Dia da Independência tendem a dificultar ainda mais um diálogo entre o presidente e as demais forças políticas.

"O governo tem uma série de dilemas muito importantes para serem encaminhados nos próximos dias e não se sabe se ele vai contar com a boa vontade de outros entes institucionais para levar essas pautas à frente", diz Souza.

Ele cita como exemplo a questão dos precatórios — um montante de R$ 90 bilhões em dívidas do governo com indivíduos e empresas, com decisão judicial definitiva —, cujo pagamento integral ou parcelado está no centro da discussão para viabilizar o Orçamento federal para 2022.

"Havia uma costura com o STF, que estava disposto a ajudar o governo a equacionar o problema", lembra Souza. "Isso agora não deve prosperar."

O governo tinha a expectativa de obter um aval para parcelar os precatórios para conseguir espaço fiscal para turbinar o Bolsa Família, de olho na reeleição. O parcelamento é visto por muitos analistas, no entanto, como uma forma de calote, já que as dívidas têm decisão definitiva da Justiça.

"Sem a reformulação do Bolsa Família, o presidente corre o risco de ter mais erosão de popularidade", considera Souza. "Para além disso, o governo tem outras agendas a serem encaminhadas, desde o combate à pandemia até a contenção da inflação, e tudo isso passa pelo diálogo com os outros entes."

Público na Avenida Paulista foi estimado em 125 mil pessoas pela Secretaria de Segurança Pública
© AFP Público na Avenida Paulista foi estimado em 125 mil pessoas pela Secretaria de Segurança Pública

Escalada da crise e reação dos poderes

Para Claudio Couto, professor de ciência política da FGV (Fundação Getulio Vargas), os protestos deste 7 de setembro foram dentro do esperado — grandes, particularmente na Avenida Paulista, mas sem surpresa, diante de tanto tempo de preparação e investimento de recursos.

"Agora, se em termos de tamanho os atos foram dentro do esperado, Bolsonaro conseguiu escalar a crise política em muitos patamares", avalia Couto, citando a sinalização do presidente de que não vai mais acatar decisões de Alexandre de Moraes e a ameaça embutida no discurso de que o ministro do STF deve "se enquadrar ou pedir para sair".

"Esse tipo de afirmação é de uma gravidade imensa: ele está dizendo que o Executivo não acatará decisões do Judiciário e de sua Suprema Corte. Isso é muito sério", considera o analista.

"Chegamos num nível de enfrentamento com os outros poderes em que não há mais condições de retorno. Passamos do ponto de não retorno e, se não houver uma reação muito forte do Congresso Nacional em relação a isso, pautando o impeachment, vamos ficar numa situação muito perigosa."

Para Couto, os protestos desta terça podem mudar a correlação de forças com relação ao impedimento presidencial. "Até ontem, certamente não tinha clima [para o impeachment], mas não sei se amanhã não haverá, depois do que aconteceu nesta terça", diz o analista.

"O que aconteceu nesta terça é de uma gravidade absurda. É o momento mais grave que já vivemos no país desde a volta da democracia — talvez desde o atentado do Riocentro", acrescenta, citando episódio ocorrido em 1981, quando setores do Exército Brasileiro descontentes com a abertura democrática tentaram realizar um atentado a bomba num evento comemorativo do Dia do Trabalhador.

"Uma situação desse tipo tem a capacidade de talvez produzir uma mudança no humor do Congresso", considera o analista, acrescentando que a postura adotada pelos governadores depois do dia de hoje também deve ser determinante para o reposicionamento do Legislativo.

Carolina Botelho, do Mackenzie e da UERJ, também avalia que a hipótese de impeachment não pode ser descartada.

"Nesta semana, Gilberto Kassab falou em entrevista que, se Bolsonaro aumentasse a disposição golpista, ele — que é um cara muito importante e que precisa ser mantido perto num presidencialismo de coalizão — apoiara o impeachment. Outros protagonistas da política estão falando o mesmo. Então é óbvio que esta carta não está descartada", diz a cientista política.

Ainda na terça-feira, o PSDB informou que o presidente do partido, Bruno Araújo, convocou reunião extraordinária da executiva para discutir a posição da legenda sobre abertura de impeachment.

O tucano João Doria, governador de São Paulo, manifestou-se pela primeira vez pelo impeachment de Bolsonaro. "Minha posição é pelo impeachment do presidente Jair Bolsonaro — depois do que ouvi hoje ele claramente afronta a Constituição", afirmou.

Também o presidente do Solidariedade, Paulinho da Força, se manifestou na terça à noite a favor do impeachment. "Na próxima semana, vou reunir a executiva do Solidariedade para debatermos o posicionamento do partido sobre abertura do processo de impeachment de Bolsonaro", escreveu o político em sua conta no Twitter. "Mais uma vez, o presidente afrontou a democracia e deu provas de que não vai parar com os ataques às instituições."

A consultoria de risco político Eurasia, por sua vez, continua vendo a hipótese de impeachment como pouco provável.

"As chances de que isso ocorra são muito baixas. Com 30% de apoio e 14 meses até as eleições do próximo ano, não há condições políticas para um impeachment", escreveram os analistas Christopher Garman e Daniela Teles, em relatório distribuído na terça-feira à noite.

"O mesmo vale para um colapso democrático, dada a robusta estrutura institucional do Brasil. Mas o risco de violência em protestos futuros persistirá em meio ao que será uma eleição muito tensa."

 Com



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