Segunda Turma do tribunal analisa dois processo nesta terça-feira: um sobre o foro e outro que pede o arquivamento das investigações
Rayanderson Guerra e André de Souza
O senador Flávio Bolsonaro, durante evento no Palácio do Planalto em 04/08/2021 Foto: .
RIO — A Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) retoma nesta terça-feira o julgamento de dois recursos envolvendo o senador Flávio Bolsonaro (Patriota-RJ) nas investigações das "rachadinhas" na Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (Alerj). O julgamento vai definir se as investigações sobre o caso devem correr na primeira ou segunda instância, e um pedido de arquivamento do caso.
O primeiro julgamento em pauta é uma reclamação do Ministério Público do Rio. Os promotores defendem que, por não ser mais deputado estadual, Flávio não tem foro privilegiado ao responder por crimes cometidos no mandato de deputado. O MP pede que o filho do presidente seja julgado em primeira instância no Tribunal de Justiça do Rio (TJ-RJ), e não em segunda, pelos desembargadores da Corte. A Corte não vai avaliar se há provas suficientes para condenar ou absolver o parlamentar, mas em qual instância da Justiça ele deve ser julgado.
O caso tramitou na 27ª Vara Criminal do Rio de Janeiro, sob a responsabilidade do juiz Flávio Itabaiana. Por dois votos a um, a 3ª Câmara Criminal do TJ entendeu que, por ter emendado os mandatos de deputado estadual (que foi até 31 de janeiro de 2019) e de senador (que começou em 1º de fevereiro de 2019), ele nunca deixou de ser parlamentar, justificando o foro privilegiado no TJ. Assim, a investigação foi retirada do juiz de primeira instância e todas as suas decisões foram anuladas.
O Ministério Público do Rio de Janeiro recorreu, e esse é um dos recursos recurso que a Turma deverá analisar. O outro foi protocolado pela defesa de Flávio, que aponta ilegalidades na investigação.
A discussão no STF se arrasta desde junho do ano passado, quando o MP apresentou seu recurso. O julgamento do pedido do MP foi adiado algumas vezes. Na sessão de 31 de agosto de 2021, o ministro Gilmar Mendes, relator do caso na Corte, informou que a defesa do senador havia apresentado razões para o adiamento e, sem entrar em maiores detalhes, concordou com o pleito. O julgamento chegou a ser marcado para a sessão seguinte da Segunda Turma, ocorrida em 13 de setembro, mas acabou não acontecendo. Em 30 de agosto, o advogado Rodrigo Roca, que defende Flávio, havia apresentado uma petição sob alegação de que estava "impossibilitado de comparecer na sessão agendada para o próximo dia 31 de agosto".
Em 9 de novembro, a Quinta Turma do STJ aceitou pedido feito pelos advogados do senador e anulou todas as decisões tomadas por Itabaiana. Na ocasião, os ministros entenderam que Flávio Bolsonaro deve ser julgado pelo órgão especial do TJ, e não em primeira instância. O principal argumento usado se baseou numa decisão tomada em maio deste ano pelo STF que manteve o foro privilegiado para deputados federais e senadores nos casos em que ocorre o chamado "mandato cruzado", o seja, quando o político é deputado federal e se elege senador, ou vice-versa. Flávio era deputado estadual, e não federal, mas a Quinta Turma do STJ entendeu que o mesmo entendimento era aplicável.
O STF, por sua vez, até o momento não deliberou sobre o foro da investigação das rachadinhas, nem a respeito da existência de "mandato cruzado" quando o político tem cargo numa esfera (a estadual por exemplo) e se elege para outra (a federal). Além do pedido do MP, a Turma vai analisar o pleito da defesa. Os representantes de Flavio argumentam que, entre as supostas ilegalidades na investigação, há relatórios produzidos pelo Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) que não poderiam ter sido usados como elementos de prova e foram compartilhados com o Ministério Público do Rio de Janeiro. Esse caso também é relatado por Gilmar Mendes.
A Segunda Turma conta atualmente com quatro ministros: Gilmar, Nunes Marques, Ricardo Lewandowski e Edson Fachin. Em caso de empate, o resultado beneficia investigados e réus em matéria penal.
Já o segundo caso é um pedido da defesa de Flávio, que pede o arquivamento das investigações. Os advogados do senador argumentam que o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) e os promotores do Ministério Público do Rio cometeram irregularidades ao longo da investigação. De acordo com os advogados, a quebra de sigilo bancário foi ilegal.
Entenda:
O que os ministros vão decidir?
São dois julgamentos distintos. O primeiro vai definir qual o foro em que o caso das rachadinhas deve ser julgado: se na primeira instância, por um juiz de primeiro grau, ou na segunda instância, pelo colegiado de desembargadores do TJ-RJ. O MP pede que o filho do presidente seja julgado em primeira instância no Tribunal de Justiça do Rio (TJ-RJ), e não em segunda, pelos desembargadores da Corte. Em junho do ano passado, Tribunal de Justiça estadual garantiu foro especial ao senador e transferiu o processo que tramitava em primeira instância para a segunda.
Já o segundo caso é um pedido da defesa de Flávio, que pede o arquivamento das investigações. Os advogados do senador argumentam que o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) e os promotores do Ministério Público do Rio cometeram irregularidades ao longo da investigação. De acordo com os advogados, a quebra de sigilo bancário foi ilegal.
Quais ilegalidades os advogados de Flávio citam ao pedir o arquivamento do caso?
Os advogados argumentam que a investigação das rachadinhas deve ser encerrada pois, segundo eles, houve ilegalidades ao longo da investigação. Entre essas supostas ilegalidades, apontam os relatórios produzidos pelo Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) que foram compartilhados com o Ministério Público do Rio de Janeiro.
Em março, a Quinta Turma do STJ considerou legal o compartilhamento com o MP do Rio de Janeiro dos dados reunidos pelo Coaf.
No pedido feito ao STF, a defesa do senador afirma que houve irregularidades na atuação do Coaf e do MP-RJ e que, por isso, todos os atos praticados a partir dos relatórios devem, segundo a defesa, ser considerados nulos.
O que dizem os relatórios do Coaf?
Os relatórios do Coaf foram a base da investigação da rachadinha. Mostraram indícios de que, no período em que Flávio Bolsonaro foi deputado estadual, funcionários dele devolviam parte dos salários que recebiam. Fabricio Queiroz, ex-assessor de Flávio Bolsonaro, apareceu no documento com movimentação suspeita de R$ 1,2 milhão.
Na última segunda-feira, o ministro João Otávio Noronha, que virou o relator das ações sobre o suposto esquema no STJ, decidiu que a ação penal que investiga a prática de rachadinha no gabinete de Flávio Bolsonaro só poderá prosseguir caso o MP do Rio apresente uma nova denúncia.
Para que o caso prossiga, além de depender de uma nova denúncia do MP, nenhuma das provas julgadas ilegais pelo STJ no início de novembro poderão ser aproveitadas no processo. A decisão de Noronha atendeu a um pedido da defesa de Queiroz.