Instituições financeiras já esperam um IPCA em 2022 até 1,5 ponto porcentual inferior ao projetado, mas elevam as expectativas para o índice no ano que vem
Retorno da cobrança do PIS/Cofins vai puxar alta da inflação ADRIANO MACHADO
Com estados anunciando a redução da alíquota do ICMS sobre
gasolina e energia elétrica — após o governo federal ter zerado o PIS/Cofins
sobre gasolina e etanol —, economistas passaram a rever suas projeções para a
inflação. Algumas instituições esperam, no ano, um IPCA (Índice Nacional de
Preços ao Consumidor Amplo) até 1,5 ponto porcentual inferior ao projetado.
Para 2023, porém, a expectativa é de alta das estimativas por causa do retorno
da cobrança do PIS/Cofins a partir de janeiro.
Cálculos preliminares do Santander, por exemplo, mostram que
o IPCA deve ficar próximo de 8% em 2022 e de 5,7% em 2023. Antes, o banco
estimava que seria de 9,5% e 5,3%, respectivamente. Já o Itaú Unibanco reviu
seu número de 2022 de 8,7% para 7,5%.
O coordenador de índice de preços da FGV (Fundação Getulio
Vargas), André Braz, também reduziu sua estimativa de 9,2% para 8,5%. Sergio
Vale, economista-chefe da consultoria MB Associados, por enquanto, fala em 8,7%
para este ano, mas acha "que poderá ser menos".
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O impacto maior da redução do ICMS deve ser observado em
julho, mês que pode registrar deflação. Segundo Daniel Karp, do Santander, na
comparação com junho, o IPCA poderá recuar até 1% no mês se todos os estados
acabarem diminuindo a alíquota do imposto.
O economista considera que cerca de 75% do corte no imposto
chegará ao consumidor final. A tendência, explica ele, é que a população gaste
o que economizar com combustível em outros itens. "Esse corte de impostos
acaba sendo um estímulo fiscal que pode sustentar a demanda, que já vinha
surpreendendo positivamente." Se não houvesse esse estímulo na demanda, a
redução do imposto poderia fazer a inflação chegar a 7%, afirma Karp.
Para Sergio Vale, porém, a grande surpresa na inflação deste
ano deve vir mais do preço dos alimentos que do valor do combustível e da
energia. "As colheitas estão andando bem. Há sinais de que isso pode
ajudar na inflação."
2023
Se o corte de impostos alivia a inflação neste ano, a mudança
deve significar uma alta em 2023. Quando o governo federal zerou o PIS e o
Cofins sobre o etanol e a gasolina, o Itaú Unibanco já elevou sua estimativa
para o IPCA no próximo ano de 4,2% para 5,6%.
A revisão foi feita porque a cobrança dos impostos será
retomada a partir de janeiro, puxando os preços para cima novamente, e também
devido à sensação de que a inflação já estava mais disseminada na economia.
Para o economista-chefe da MB Associados, Sergio Vale, a
inflação no próximo ano "está caminhando para ficar entre 5% e 6%".
"No curto prazo, pode haver um recuo na inflação. Mas tenho dificuldade de
saber se essa queda não será limitada por conta do cenário do câmbio."
A preocupação de Vale é que a diminuição na arrecadação
desencadeie uma maior desconfiança do mercado em relação à capacidade de o
governo pagar suas dívidas. Isso poderia fazer com que parte dos investidores
deixasse o Brasil, desvalorizando o real em relação ao dólar — o que
pressionaria a inflação.
Questão fiscal
O economista afirma ainda que a situação fiscal deve
permanecer controlada neste ano, dado que a arrecadação está em alta devido ao
aumento do preço das commodities. O entrave pode vir em 2023, pois a previsão é
que a economia mundial comece a desacelerar, fazendo com que a cotação das
commodities caia — e reduza a arrecadação também.
"O mais complicado é que você está cortando algo [o
ICMS] de forma permanente. Aí, no ano que vem, a alíquota será mais baixa em
cima de uma arrecadação mais baixa também. Isso coloca peso na situação
fiscal", diz Vale.
Para o economista Daniel Karp, do Santander, ainda é difícil
calcular como a questão fiscal vai interferir na inflação, dado que o cenário
internacional também pode modificar o câmbio. Já na visão do economista André
Braz, da FGV, "qualquer medida que não dure para 2023 acaba impondo uma
inflação mais alta no ano que vem".
Braz destaca que as incertezas globais também podem pressionar os preços em 2023, como já ocorreu neste ano. Ele lembra que, no início de 2022, os economistas estavam otimistas com a inflação e não imaginavam que ela poderia chegar perto de 10%. A guerra na Ucrânia, porém, levou a cotação do petróleo e a inflação a outro patamar. "Isso pode se repetir no ano que vem, a depender do desenrolar dessas fontes de incerteza e de como vai ficar essa questão fiscal."