Passeios não conquistaram indecisos, apontam analistas ouvidos pela agência de notícias
Aposta da campanha para que aparecesse como um
"estadista", a viagem do presidente Jair Bolsonaro a Londres e Nova
York rendeu espaços em jornais e discussões nas redes sociais, mas não os
frutos que, esperavam seus aliados, pudessem se transformar em votos nas
eleições deste ano.
Depois de um dia e meio da visita, o presidente brasileiro
apareceu em um dos principais jornais britânicos, o conservador The Times:
"Bolsonaro interrompe luto para marcar pontos na política", dizia o
título de uma matéria sobre o vídeo, distribuído nas redes sociais, em que ele
tentava comparar o preço da gasolina no Reino Unido com o Brasil.
Da chegada a Londres, onde fez um discurso a apoiadores
reunidos em frente a embaixada no qual afirmou que ganharia no primeiro turno
--apesar de todas as pesquisas em contrário--, a cenas de seus partidários
xingando um inglês que pedia respeito ao dia do funeral da rainha Elizabeth 2,
tudo trouxe ao presidente mais críticas que elogios.
Nas redes sociais, antagonistas do presidente consequiram
ocupar mais espaço que seus apoiadores, com hashtags negativas ganhando
destaque no Twitter. A principal delas, "Bolsonaro Vergonha Mundial",
se mantém desde segunda-feira entre as principais na rede.
Em Nova York, onde na manhã desta terça abriu com seu
discurso a Assembleia Geral das Nações Unidas, Bolsonaro foi recebido por
apoiadores, mas também por protestos ao chegar a seu hotel --que precisou
reforçar a segurança para dividir os dois grupos.
Na noite de segunda, quando Bolsonaro chegou à cidade, a
lateral do prédio da ONU recebeu uma projeção com protestos contra o
brasileiro: mentiroso, vergonha brasileira, desgraça foram algumas das palavras
que acompanhavam fotos do presidente.
O protesto foi feito pela US Network for Democracy in Brazil,
uma organização que reúne ONGs, acadêmicos e universidades em defesa da
democracia no país. O mesmo protesto, com projeções em caminhões que ficaram
rodando a cidade, foi feito em Los Angeles, durante a Cúpula das Américas,
quando Bolsonaro esteve presente.
Em seu discurso na abertura da Assembleia Geral, Bolsonaro
falou para o Brasil, e não para o mundo, quando concentrou sua fala em números
e fatos internos que pouco sentido fazem para uma plateia internacional,
criticou adversários e encerrou sua participação com o lema Deus, Pátria,
Família e Liberdade.
"Principal objetivo dessa viagem foi eleitoral, não teve
nenhum objetivo de política externa", diz o professor de Relações
Internacionais da Fundação Getúlio Vargas, Oliver Stuenkel. "O discurso
(nas Nações Unidas) foi puramente doméstico, sem nenhuma pretensão de o Brasil
ser ator que contribui ativamente para questões internacionais, além de frases
de efeito eleitoral."
Stuenkel ressalta que houve aparentemente um esforço maior de
moderação do que em anos anteriores, em que Bolsonaro atacou diretamente outras
nações, como a França. Ao mesmo tempo, destaca que também o impacto do que o
presidente disse é menor, já que é visto pela comunidade internacional como um
presidente de saída.
A própria agenda de Bolsonaro, para além desse discurso, foi
tímida. Apesar dos esforços do Itamaraty, o presidente brasileiro conseguiu
encaixar apenas um encontro pró-forma com Antonio Guterrez, secretário-geral da
ONU, e com presidentes como o da Polônia, Andrzej Duda, com quem compartilha a
linha política de extrema direita.
Seja como for, a viagem fez sucesso entre seus apoiadores,
que elogiaram a simples presença de Bolsonaro no funeral de Elizabeth e seu
discurso nas Nações Unidas. Mas sua campanha pouco vai poder aproveitar da
viagem para tentar convencer indecisos de que Bolsonaro é, de fato, um
estadista, e não um pária mundial, como acusa seu principal rival, o
ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT): uma decisão do Tribunal Superior
Eleitoral (TSE), em resposta a pedidos da União Brasil e do PT, proibiu o uso
das imagens em material de campanha.
Vídeo