Contrariando acórdão do TCU, ex-presidente Jair Bolsonaro decidiu ficar com fuzil e pistola que ganhou nos Emirados Árabes em 2019
A caixa de joias da Arábia Saudita não é o único presente de
alto valor que Jair Bolsonaro ganhou no Oriente Médio. Em outubro de 2019, o
ex-presidente voltou ao Brasil de uma viagem à região com uma pistola e um
fuzil, este último customizado com seu nome.
A coluna conversou com pessoas que estiveram com Bolsonaro na
viagem, que durou 10 dias e passou por Emirados Árabes Unidos, Catar e Arábia
Saudita. Eles relatam que Bolsonaro voltou no avião presidencial com um fuzil e
uma pistola que ganhou de presente nos Emirados Árabes.
O fuzil é de calibre 5,56 mm e a pistola, 9 mm. No site Casa
do Tiro, um fuzil semelhante custa de R$ 32 mil a R$ 42 mil. A pistola é de R$
5,9 mil a R$ 15,6 mil. Os preços variam no mercado internacional, a depender da
procedência.
As armas, segundo integrantes da comitiva, teriam sido
presentes de um príncipe de uma família real dos Emirados Árabes. O fuzil foi
entregue a um terceiro, que repassou o bem a Bolsonaro dentro do avião da Força
Aérea Brasileira (FAB). O ex-presidente teria gostado do presente.
Na mesma viagem, membros da comitiva receberam relógios de
luxo. Há pouco mais de uma semana, o Tribunal de Contas da União (TCU)
determinou que os itens fossem devolvidos e considerou que os presentes violam
as regras da Corte.
Em tese, o caso das armas deve seguir o mesmo caminho,
segundo ministros ouvidos pela coluna.
Os relógios em questão custavam até R$ 53 mil, valor
semelhante ao das armas no mercado brasileiro. Seu valor comercial foi levado
em consideração pelo TCU ao determinar que eles deveriam ser devolvidos ao
patrimônio da União.
“O recebimento de presentes de uso pessoal com elevado valor
comercial por agente público em missão diplomática extrapola os limites de
razoabilidade”, registrou o TCU em acórdão de 1º de março.
Em 2016, o TCU determinou que devem ser destinados ao
patrimônio da União todos os presentes recebidos nas audiências de autoridades
com outros chefes de Estado ou de governo, independentemente do nome dado ao
evento pelos cerimoniais e o local onde aconteceram.
O entendimento inclui
comitivas que façam viagens a outros países.
A exceção são apenas “itens de natureza personalíssima
(medalhas personalizadas e grã-colar) ou de consumo direto (bonés, camisetas,
gravata, chinelo, perfumes, entre outros)”, segundo o tribunal.
Pessoas que presenciaram o recebimento do fuzil e da pistola
dizem que os bens teriam sido registrados pelo Exército, como demanda a
legislação brasileira no caso de importação de armas. Procurado, o Exército não
se pronunciou.
A coluna perguntou à assessoria do ex-presidente onde estão
as armas, quais seus modelos específicos e valores estimados, e se o presidente
recebeu outras armas de presente durante seu mandato. Também perguntou se ele
pretende devolvê-las. Não houve resposta até a publicação desta reportagem.
Se houver destinação pessoal, é preciso pagar imposto sobre
as armas, o que o presidente também não confirma se ocorreu. Segundo auditores
fiscais ouvidos pela coluna, deve ser pago o imposto de qualquer bem importado,
sejam joias, relógios ou armas, se o item não for destinado ao patrimônio da
União. A alíquota é de 60% do valor do produto, em regra.
Em novembro de 2021, o então presidente Bolsonaro disse que
tinha dois fuzis em casa e que deixava pelo menos um deles no seu quarto.
“Eu tenho dois (fuzis) em casa. Se a mulher sair do quarto,
tudo bem. Mas o fuzil fica lá, tá certo? Ele não sai”, disse, em transmissão em
rede social.