"Já passou da hora de arriar a lona do circo neopentecostal bolsonarista", defende Ricardo Nêggo Tom
Por- Ricardo Nêggo Tom
Até quando nós vamos continuar assistindo passivamente ao
exercício de pura desonestidade intelectual e vagabundagem moral, sob a máscara
da liberdade de expressão, que vem sendo praticado pelo bolsonarismo e suas
vertentes diabólicas? Se fosse apenas a sonoplastia esdrúxula e a reunião de
milhares de celerados no mesmo espaço vivendo a mesma distopia e aplaudindo um
discurso em inglês feito por um deputado patriota em homenagem ao seu novo
salvador estrangeiro, nós riríamos e seguiríamos em frente. Porém, o que existe
por trás dessas estúpidas manifestações bolsonaristas é o puro suco do fascismo
político, econômico e religioso. Uma ode à insanidade cognitiva e um réquiem da
dignidade existencial humana. Estamos morrendo mais um pouco como sociedade, a
cada ato em favor de uma figura que representou o que houve de pior na história
da política brasileira. A marcha para o diabo, 2ª edição, cumpriu o que prometia.
Embora o público tenha ficado abaixo das expectativas, as falas das ilustres
lideranças presentes ao evento não decepcionaram e mais uma vez justificaram o
porquê de os bolsonaristas condenarem o uso do órgão excretor para relações
sexuais. Eles utilizam os seus para formularem ideias e verbalizá-las.
Sei que o título do artigo irá gerar polêmicas e críticas de
fundamentalistas e de não fundamentalistas também. Isto porque quando se fala o
nome de Jesus, ainda que ele esteja sendo pronunciado por bocas fétidas como as
de Silas Malafaia e Michelle Bolsonaro, faz surgir em nosso imaginário a ideia
de que o evangelho de Cristo está sendo louvado. No entanto, quando dizemos que
o Brasil é do senhor Jesus ou que Deus está no controle de tudo, estamos atribuindo
a eles todas as injustiças, desigualdades e violências cometidas sobre a terra.
Afinal, se ele está no controle e não muda essa realidade, é porque ele entende
que assim deve ser. Ou seja, legitima o discurso político-religioso excludente
que tenta nos convencer de que quem é próspero materialmente é abençoado por
Deus, e os mais pobres precisam se contentar com a opressão imposta porque essa
é a vontade de Deus para eles. E muitos evangélicos e católicos do campo
progressista acreditam que Deus está no controle de tudo, o que, de certa
forma, acaba isentando o Estado de responsabilidade sobre o caos social que ele
promove sob estruturação.
Um caos que tem tudo para se ampliar após o deputado Nikolas
Ferreira dizer ao público que “o país não precisa de mais projetos de lei, mas
de homens com testosterona”, o que soa como um apelo desesperado de alguém cujo
referido hormônio está em baixa quantidade. Um pedido de socorro aos homens
deste país, mediante a insignificância e fragilidade da sua própria
masculinidade. Um apelo coerente com as atitudes de alguém que vestiu uma
peruca loira e subiu à tribuna da Câmara para atacar mulheres trans. Além do
machismo e misoginia da declaração, que foi aplaudida pelas mulheres bolsonaristas
presentes, em grande parte, senhoras idosas. Talvez, a maioria não saiba o que
é testosterona, assim como não sabiam que Israel não é um país cristão. Israel
que foi citado na fala de Jezabel Bolsonaro como a terra santa abençoada por
Deus. Observem como o deus do bolsonarismo adoram os poderosos e os opressores.
Michelle dessa vez não falou tanto. Quem sabe, por ter menos testosterona do
que a maioria dos presentes no palanque. Mas como sempre invocou o sobrenatural
e reforçou a conclamação da luta contra o mal, feita no evento da Paulista.
A profetisa do inferno bolsonarista parece que está ficando
sem repertório e corre o risco de ter o seu blefe de mulher religiosamente
virtuosa desmascarado. Não basta usar uma camisa escrito “o Brasil é do senhor
Jesus” e repetir que os inimigos tremem diante da palavra do seu deus. Talvez
seja a hora de ela discursar em línguas estranhas, como fez o deputado Gustavo
Gayer, que falou em inglês para que o mundo inteiro saiba que Elon Musk é o
novo senhor e salvador da pátria brasileira. Aliás, o bilionário com sobrenome
que exala cheiro de testículo de bode foi glorificado por diversas vezes
durante a manifestação. Bolsonaro foi o mais entusiasmado em louvar o novo mito
da extrema-direita. Só não arriscou fazê-lo em inglês, porque a patriotada
seria épica. Com seu mal e porco português, ele disse que o dono do “X” é o
homem que luta por liberdade para todo o mundo e pediu uma forte salva de
palmas para o seu novo dono. Uma subserviência mítica que fez o gado mugir em honra
ao homem mais desprovido de caráter dos dias atuais.
Bolsonaro também incitou os seus ruminantes apoiadores a
combaterem Alexandre de Moraes, o atual governo e a lutarem pela liberdade que
está em risco. Um discurso que ainda reverbera entre a sua claque, que é
composta por pessoas que acreditam que serem racistas, machistas, homofóbicas,
intolerantes, preconceituosas e violentas, é um direito que a liberdade de
expressão lhes confere. Não é não! E o judiciário precisa fazer com que eles
aceitem isso, ou vai doer mais em suas “liberdades” O ex-presidente ainda
tentou dar um último tom messiânico a sua presença no ato, dizendo ao povo,
digo, ao gado, que “se algo ruim acontecer comigo, não desanimem”, evocando a
suposta facada em Juiz de Fora e vaticinando um novo atentado contra si. O
messias dos violentos tentando se fazer ideologicamente imortal diante do seu
séquito. Séquito esse que ele já divide o comando com Silas Malafaia, que
também se apresenta como candidato a Jesus na frase que Michelle exibia em sua
camisa.
Malafaia atacou abertamente o STF sem nenhum pudor, repetindo
que o Estado de direito no Brasil está em perigo e que Alexandre de Moraes é um
ditador de toga. Mais um apelo à própria prisão que não deveria ficar sem uma
justa resposta por parte do judiciário brasileiro. Sinceramente, apenas o dever
jornalístico me obriga a ouvir a voz do empresário da fé Silas Malafaia, que
representa o que há de mais pernóstico e sorrateiro na linguagem evangélica
brasileira. Um ser nauseante do chifre à ponta do rabo. Um ungido do senhor
imperialismo que segue usando a religião e a fé das pessoas para manipulá-las
em defesa de seus interesses pessoais e financeiros. Como ele mesmo disse em entrevista à
influenciadora bolsonarista Antonia Fontenelle, “tocar em um líder religioso
não é uma coisa fácil”, acrescentando que ele é líder de uma religião que
representa 35% do povo brasileiro. Concluindo que “isso é um negócio gigante” e
que o STF não se atreveria a prendê-lo ou a mexer com ele.
Esse é o Brasil que líderes evangélicos como Malafaia, entre tantos outros, desejam. Esse seria o Brasil que pertence ao “senhor Jesus” estampado na camisa de Michelle. Um Brasil fundamentalmente fascista e fascinantemente fundamentalista. Esse é o Brasil que seria a Israel dos trópicos. A terra santa que Bolsonaro louvou em seu discurso, e que teria sido prometida pelo deus que ele representa ao seu gado rancoroso, alienado e ruminante. O dia em que o Brasil pertencer ao senhor de Michelle, Malafaia e Bolsonaro, estaremos num inferno sem precedentes, onde só haverá choro e ranger de dentes para aqueles que não dobrarem o seu joelho diante do rei dos picaretas da fé. Um rei que é mutante e transitório, segundo as conveniências da salvação a ser defendida. No momento, Elon Musk é o libertador enviado por Deus para salvar a pátria. Nada, absolutamente nada é mais diabólico do que se utilizar do nome de Deus para impor domínio. Em nome do Estado laico, eu determino que o Brasil nunca será um evangelistão. Nunca! Tá repreendido, em nome da Constituição! O Sangue da democracia tem poder! Deus nos livre desse inferno!
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