Mudança valerá somente para relacionamentos no regime de separação de bens
Na grande maioria dos casos a mulher será beneficiadaO dispositivo será aplicado apenas às uniões no regime de
separação total de bens e busca remunerar o chamado trabalho invisível, em que
a pessoa que assumiu a tarefa doméstica, muitas vezes abandonando um emprego
fora de casa, corre o risco de sair do relacionamento sem direito a nada.
O código atual, sancionado em 2002, não prevê essa
compensação. Alguns juízes estabelecem indenizações nesses casos, mas não há
uma jurisprudência definida sobre a questão. Há também pactos antenupciais que
preveem essa remuneração, algo que ainda é raro no país.
A proposta nasceu a partir de uma comissão de juristas e foi
apresentada formalmente como projeto de lei no Congresso (PL 4/2025) em janeiro deste ano pelo senador Rodrigo
Pacheco (PSD-MG).
O capítulo sobre o regime de separação traz duas propostas de
mudança na lei (artigo 1.688). Primeiro, diz que haverá a divisão de bens
adquiridos por ambos os cônjuges ou conviventes com a contribuição econômica
direta de ambos, respeitada a sua proporcionalidade. Mesmo que ele esteja
registrado no nome de apenas um deles.
Diz ainda que “o trabalho realizado na residência da família
e os cuidados com a prole, quando houver, darão direito a obter uma compensação
que o juiz fixará, na falta de acordo, ao tempo da extinção da entidade
familiar”.
“[O projeto] tem uma preocupação com a invisibilidade do
trabalho feminino. Embora a Constituição garanta igualdade, a gente não ganha a
mesma coisa que um homem. O processo legislativo tenta dar uma equilibrada
nisso. Se vai conseguir, não sabemos”, afirma Renata Mangueira de Souza
Gasparini, especialista em contencioso cível, família e sucessões do escritório
Gasparini, Barbosa e Freire Advogados.
Ela afirma que a lei não traz parâmetros objetivos sobre essa
indenização, o que seria muito difícil de fazer em uma legislação tão ampla, e
que o juiz terá de analisar, no caso concreto, questões como patrimônio, tempo
de união e outros pontos específicos sobre a vida e os filhos do casal.
Silvia Felipe Marzagão, especialista em direito de família e
sucessões e sócia do escritório Silvia Felipe e Eleonora Mattos Advogadas,
afirma que é positivo ter uma regra que preveja indenizar aquele que trabalhou
no cuidado com a família e não vai ter nenhum tipo de patrimônio no fim da
relação, mas defende que haja alguns parâmetros para isso.
“A intenção legislativa parece boa, mas a forma como está
escrito talvez tenha que ser um pouco mais amadurecida, para ficar claro quais
os critérios para que essa indenização seja concedida.”
Ela diz que a compensação não se aplica ao regime de comunhão
parcial, que já garante a esse companheiro ou companheira metade dos bens
constituídos durante a relação.
As duas advogadas afirmam que essa alteração no código também
busca compensar outra mudança proposta.
Atualmente, esse cônjuge tem direito a disputar com os filhos
o patrimônio adquirido antes do relacionamento —a separação total só afasta
esse companheiro da herança formada pelos bens constituídos durante
o casamento. Essa regra se aplica somente para herança, não para divórcio.
Isso não pode ser alterado nem por testamento.
A proposta de reforma do código afasta o cônjuge da disputa
por essa herança, que muitas vezes vem de outro relacionamento. Com isso,
haverá um retorno à regra vigente antes da sanção do código atual.
“O código de 2002 colocou o cônjuge em uma situação vantajosa
em relação aos filhos. Criou aquilo que a gente chama de ‘super cônjuge’. A
reforma revê isso, mas ela também não pode criar um ‘mini-cônjuge’. Então ela
tenta equilibrar essa relação”, afirma Renata Gasparini.
Mudanças no regime de separação de bens
- Admite-se
a divisão de bens adquiridos por ambos os cônjuges ou conviventes com a
contribuição econômica direta de ambos, respeitada a sua
proporcionalidade.
- O
trabalho realizado na residência da família e os cuidados com os filhos,
quando houver, darão direito a obter uma compensação que o juiz fixará, na
falta de acordo, ao tempo da extinção da entidade familiar.
Fonte: PL 4/2025 – Senado Federal
Da Redação