Conheci Sérgio Piaba na mesa do boteco, em reunião de diretoria
do bloco carnavalesco e etílico As Cuecas,
onde fui aceito como sócio benemérito desse grêmio recreativo caricato da cueca
100% algodão colorido, porque a galera tem alergia às cuecas de elastano, ou
laycra, e também pelo nobre e cobiçoso motivo de que o principal acionista do
bloco é nosso compadre Dalmo Oliveira, entusiasta das experiências inovadoras
da Embrapa no melhoramento genético das cores do nosso algodão. Esse bloco,
elevadamente machista, até hoje tem pouquíssimas mulheres em suas fileiras
foliãs. Como diria Marilyn Monroe, “tragam-me as calcinhas de seda pois não sou
mulher de usar as de algodão”. A feminista Madame Preciosa impetrou recurso em
processo para mexer no nome do bloco, que passaria a se chamar As Cuecas e as Calcinhas, apelação
derrotada pelos tradicionalistas. Mesmo
porque o bloco existe em louvor ao compositor Livardo Alves, autor da marchinha
famosa, integrante da lista das vinte melhores marchinhas de carnaval de todos
os tempos.
Sérgio não se define, porém, só como poeta visual. Ele também
esbanja criatividade na poesia sonora, como editor de programas de rádio onde
exibe sua performance na estruturação dos sons. Comigo, que sou um locutor
correndo atrás de variantes para evitar usar só a palavra como mero veículo de
significados, Sérgio faz parceria na composição de textos fonéticos e sons diversos
para montagem de imagens acústicas nos programas experimentais em rádios
alternativas como a Rádio DiarioPB. Pense num sonoplasta inovador e fecundo!
Desses que só se criam em rádios comunitárias e alternativas, sem compromisso
com público ouvinte nem com anunciante. Em torno dos processos de som em um
programa de rádio, ninguém amarra a chuteira nem veste a camisa de Sérgio Piaba
Camisas, ele que também vende camisas personalizadas com suas artes arretadas e
suas cores de Portinari de Bayeux. De sua arte emana o cheiro de caranguejo, a
maresia da inquietação e o vigor da maré cheia com o revoltado e teatral Piaba
comandando o impuro, profano e encardido bloco da Cueca em busca de ondas puras
e sonhos inovadores, férteis e libertadores. E tem aquele quê de humildade,
ausente em muito figurão na cena artística. “Não sou maior nem menor do que
ninguém, mesmo porque o que eu faço não é prova de atletismo, e sim uma briga
comigo mesmo pra comunicar o belo da forma que eu vejo”, esclarece Piaba,
merecendo citação de Karl Kraus, dramaturgo austríaco: "Os artistas têm o direito de serem modestos e o dever de serem
vaidosos”.
O poeta Sérgio Piaba é a cara do comunicador a serviço de uma
causa, mas que não abre mão de uma dicção qualificada e, sobretudo,
comprometida com as questões sociais e políticas de seu tempo. A vida e obra de
Piaba é um manifesto contrário a governos autocráticos que estão sempre a
alimentar os conflitos armados e às elites atrasadas, burras, cínicas e
insensíveis. Um peixinho ferroando a parte do mundo sujo que nos toca, sem
desistir de ser sempre uma piaba ligeira dando pitu nos lambaris do fascismo.
Por Fábio Mozart