"O pastor atraiu Bolsonaro para o que pode ter sido um dos maiores fiascos da extrema direita", escreve o colunista Moisés Mendes
Até as baleias vistas de longe e citadas pelo deputado
Gustavo Gayer sabiam que a aglomeração de Copacabana era de alto risco para o
fascismo. E se confirmou o que muitos temiam.
A aglomeração fracassou pelo que não conseguiu acrescentar à
manifestação de 25 de fevereiro na Paulista. O ato pode ser considerado, pelo
contexto político, um fiasco histórico
Para usar um clichê da extrema direita, Bolsonaro e Malafaia
mantêm uma narrativa, mas não conseguem mais criar um fato novo, como gesto
político, que a sustente.
A narrativa dos ataques a Alexandre de Moraes como ministro
censor e autoritário e de desqualificação das provas do golpe chegou à exaustão
na aglomeração em Copacabana.
A repetição de que a direita é perseguida e censurada se
tornou uma chatice e resultou no que de pior pode acontecer na política. Quase
anulou, pela baixa presença e pela carência retórica, tudo o que eles fizeram
até aqui.
O ato no Rio não precisava ser maior do que o de São Paulo.
Mas deveria expressar um acréscimo como ação política e respaldo da base de
tios e tias do zap. Foi um retrocesso, até porque os grandes nomes do
bolsonarismo não apareceram.
Malafaia atacou Moraes citando-o por 24 vezes, depois de se
referir ao ministro por 16 vezes em São Paulo. Definiu Moraes como ditador e
insinuou que o Senado deve pedir seu impeachment sob pressão popular.
Mas não agregou quase nada ao que havia dito na Paulista.
Michelle fez uma pregação religiosa básica, de curso para pastores, e os outros
oradores foram tão insignificantes que não há o que citar do que disseram. Com
exceção da poética referência às baleias, feita por Gayer.
Bolsonaro falou por 34 minutos, anunciando várias vezes que
iria encerrar o discurso, como se perseguisse uma ideia melhor, uma frase, uma
eureca. Ele sabe o que viu de cima do caminhão.
Viu Copacabana quase sem gente para ouvi-lo dizer que sempre
jogou nas quatro linhas, que está cercado e que pode ser preso a qualquer
momento.
O que fica da aglomeração é que nem Malafaia nem Bolsonaro,
agora sem os militares, têm força suficiente para desfazer o cerco do Supremo e
pressionar ou desqualificar Alexandre de Moraes.
Ambos deixaram claro que o inquérito das fake news é o que
mais preocupa, porque está perto do desfecho. Que bateu um cansaço também no
fascismo, como já havia batido nas esquerdas. E que eles dependem agora de algo
além do apoio do gângster Elon Musk.
Há um esgotamento de repertório no que a extrema direita tem
a dizer. O bolsonarismo pode estar se tornando chato para os próprios
bolsonaristas, ou Copacabana, um dos melhores lugares do Brasil para uma
aglomeração domingueira, não teria atraído poucos tios.
A surpresa do evento foi a presença da cubana Zoe Martinez,
que se apresentou como uma refugiada do comunismo e fez uma pergunta inusitada
aos idosos que foram à praia: quem de vocês se lembra quando começou a usar
papel higiênico? E disse então que conheceu papel higiênico aos 12 anos no Brasil,
porque não havia em Cuba.
A extrema brasileira atraiu para a aglomeração fracassada uma cubana que tenta ajudar na mobilização do povo de Bolsonaro com a nova narrativa do papel higiênico.
O evento no Rio foi terrivelmente fracassado, em todos os
sentidos. Tanto que, abatido, Bolsonaro disse ao final: “Se algo de ruim acontecer
comigo, não desistam”.
Estava insinuando de novo que pode vir a sofrer outro
atentado, para investir na ideia de que é um alvo permanente a ser eliminado.
O que a aglomeração mostrou, como indiferença do próprio
povo, é que Bolsonaro já pode ser preso, depois de agradecer mais uma vez a
Deus “pela segunda vida que me deste em Juiz de Fora”.
Ficou complicado, depois do fiasco organizado por Malafaia em
Copacabana, assegurar uma nova vida política a Bolsonaro.