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 Marcos Mendes, economista do Insper, e Caio Megale, hoje economista-chefe da XP, são contrários ao reajuste automático do benefício pela inflação

Caio Megale, ex-integrante da equipe de Guedes, e Marcos Mendes, do Insper Foto: Agência O Globo

A substituição do Bolsa Família pelo programa de transferência de renda do governo de Jair Bolsonaro, o Auxílio Brasil, tem gerado preocupações entre agentes de mercado e economistas em razão dos impactos fiscais da medida.

É que o novo programa amplia não apenas o número de beneficiários, mas também o valor dos pagamentos mensais, sem que haja espaço no Orçamento para isso.

Auxílio Brasil:  Ministro da Cidadania diz que governo discorda de correção automática

Mas a possibilidade de uma nova mudança no programa pode agravar ainda mais a situação fiscal do país, apontam os economistas Marcos Mendes, pesquisador associado do Insper e um dos pais do teto de gastos, e Caio Megale, ex-integrante da equipe de Paulo Guedes e economista-chefe da XP.

O relator da Medida Provisória que cria o programa Auxílio Brasil, deputado Marcelo Aro (PP-MG), anunciou que vai prever um mecanismo de correção automática do benefício pela inflação, o que na prática cria uma nova amarra no Orçamento.

Além disso, o governo tem divulgado que pretende zerar a fila de pessoas à espera do benefício, concedendo o auxílio para todos que têm direito.

Para Mendes, essa medida aumentaria a judicialização, já que possibilitaria que muitas pessoas buscassem brechas na regulação para alegar direito ao pagamento. Isso, além de desviar o foco do programa, ainda poderia gerar um aumento dos precatórios, isto é, das dívidas judiciais do governo sem chance de recurso.

A questão preocupa porque o governo apresentou ao Congresso a proposta de emenda à Constituição (PEC) dos Precatórios, que adia o pagamento dessas dívidas, justamente como forma de abrir espaço no Orçamento para a ampliação do Auxílio Brasil. O texto está tramitando no Senado.

O economista Marcos Mendes é pesquisador do Insper Foto: Pedro Ladeira / Agência O Globo/FolhaPress
O economista Marcos Mendes é pesquisador do Insper Foto: Pedro Ladeira / Agência O Globo/FolhaPress

Veja a entrevista com o economista Marcos Mendes, um dos pais do teto de gastos:

Como o senhor avalia o Auxílio Brasil proposto pelo governo e essa nova possibilidade de reajuste automático do valor dos benefícios, de acordo com a inflação?

Vai ser mais uma despesa rígida e obrigatória, porque a proposta do governo está sendo zerar a fila, para que o Auxílio Brasil seja pago a todos que têm direito, como se fosse a Previdência e o BPC/Loas. Isso abre uma porta tremenda para a judicialização, como ocorreu com o próprio BPC.

Pessoas que não são elegíveis entram na Justiça explorando alguma brecha na lei para que possam receber o benefício, o que perde o foco do programa e ainda aumenta a despesa com precatórios.

Muitos economistas alegam que o Orçamento hoje é muito rígido, com mais de 90% das despesas sendo obrigatórias. Mas se os gastos previdenciários e assistenciais são indexados à inflação, o Auxílio Brasil não deveria ser também?

Não, deveria haver uma desindexação dos demais. A indexação congela preferências orçamentárias e reproduz a inflação do passado para o futuro. A princípio é melhor que os reajustes sejam dados dentro do possível e não de forma automática. O Brasil já gasta bastante com política social, o problema é que gasta mal.

O país gasta quase 13% do PIB (Produto Interno Bruto) com políticas sociais, enquanto outras nações emergentes comprometem cerca de 4% do PIB com essas medidas. Se pegarmos todos os gastos com BPC/Loas, seguro-desemprego, aposentadoria rural, abono salarial, e distribuísse entre os 40% mais pobres do Brasil, conseguiríamos pagar R$ 700 para cada família.

O que é preciso fazer é reformular os programas sociais para que cheguem aos mais pobres e não sejam desviados para a classe média.

“"Tem que dar o benefício aos mais pobres sem matar a galinha dos ovos de ouro. Se a economia cresce menos, a gente tem cada vez mais pobres e vai ter que pagar cada vez mais benefícios"”

Quais são os impactos do reajuste automático do Auxílio Brasil e da ampliação do programa na economia, na situação fiscal do país e na inflação?

O impacto inflacionário depende da situação da economia. Mas a medida aumenta a fragilidade fiscal e, numa situação de risco fiscal, as pessoas vão pedir mais juros, que é o que já estamos vendo acontecer. Isso aponta na direção de menor crescimento econômico, o que pode degenerar também a inflação.

Tem que dar o benefício aos mais pobres sem matar a galinha dos ovos de ouro. Se a economia cresce menos, a gente tem cada vez mais pobres e vai ter que pagar cada vez mais benefícios.

“"O Brasil já gasta bastante com política social, o problema é que gasta mal"”

Caio Megale, economista-chefe da XP Investimentos Foto: Washington Costa/15-1-2019 / SEPEC/ME
Caio Megale, economista-chefe da XP Investimentos Foto: Washington Costa/15-1-2019 / SEPEC/ME

 Veja a entrevista com Caio Megale, ex-integrante da equipe de Paulo Guedes e economista-chefe da XP.

Como o senhor avalia o Auxílio Brasil proposto pelo governo e essa nova possibilidade de reajuste automático do valor dos benefícios, de acordo com a inflação?

Este é um momento que de fato demanda um olhar especial sobre os temas sociais. No entanto, o mercado enxerga com cautela duas questões. A primeira é o valor do benefício. Qual é o valor razoável? Onde está o embasamento técnico para esse novo valor de R$ 400 proposto pelo governo? Parece ser um número meio arredondado e a gente sabe que cada real é importante em um momento em que é preciso ter cuidado com as contas públicas.

Porque esse gasto traz um risco econômico para a frente que acaba consumindo o efeito positivo do programa. Para ser sustentável ao longo do tempo ele deveria respeitar o teto de gastos, que é uma âncora importante. A segunda questão é a criação de um novo indexador no Orçamento.

“"A indexação torna mais difícil o trabalho do Banco Central de trazer a inflação para baixo"”

Muitos economistas alegam que o Orçamento hoje é muito rígido, com mais de 90% das despesas sendo obrigatórias. Mas se os gastos previdenciários e assistenciais são indexados à inflação, o Auxílio Brasil não deveria ser também?

A questão da indexação eu acho bastante preocupante. O ministro Paulo Guedes tinha o mantra dos três Ds, que eram desobrigar, desvincular e desindexar, para deixar o Orçamento mais manejável, e esse reajuste automático vai na direção contrária.

É um problema porque limita a possibilidade de fazer escolhas mais para a frente. Claro que manter o poder de compra das pessoas é importante, mas em determinados momentos há outras questões que também são importantes, e seria importante ter essa flexibilidade.

A indexação é um problema em si. Hoje a cada 1% de inflação que se tem a mais são quase R$ 10 bilhões de gastos no Orçamento. Esse valor poderia ser usado para fazer uma sensacional obra de infraestrutura em regiões carentes, por exemplo, que poderia ajudar muito mais a população.

“"O ministro Paulo Guedes tinha o mantra dos três Ds, que eram desobrigar, desvincular e desindexar, para deixar o Orçamento mais manejável, e esse reajuste automático vai na direção contrária."”

Quais são os impactos do reajuste automático do Auxílio Brasil e da ampliação do programa na economia, na situação fiscal do país e na inflação?

A indexação por definição torna mais difícil o trabalho do Banco Central de trazer a inflação para baixo. No curto prazo, a inflação é turbinada pela taxa de câmbio, que tem a ver com o risco fiscal. Essa percepção de risco aumenta conforme a dívida pública cresce para fazer frente a esses programas. Existe o efeito da demanda, que precisa desacelerar, mas o principal é o efeito na credibilidade fiscal do país.



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