As informações constam na investigação realizada pelo Ministério Público do Rio de Janeiro contra Carlos sob suspeita de envolvimento num esquema de "rachadinha"
O vereador Carlos Bolsonaro (PL) acessou o cofre que mantinha
no Banco do Brasil nos mesmos dias em que o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL)
adquiriu imóveis em transações com características suspeitas.
Dados do banco mostram que o vereador e o senador Flávio
Bolsonaro (PL), que também usava o serviço, acessaram 153 vezes as duas caixas
mantidas no local ao longo dos 12 anos. A frequência média foi de uma vez por
mês, embora exista casos de duas entradas num mesmo dia.
As informações constam na investigação realizada pelo
Ministério Público do Rio de Janeiro contra Carlos sob suspeita de envolvimento
num esquema de "rachadinha" em seu gabinete na Câmara Municipal. A
apuração resultou numa denúncia contra sete servidores do vereador, mas o
procedimento contra o filho do ex-presidente foi arquivado por falta de provas.
A defesa de Carlos não comentou as informações, mantendo o
posicionamento do vereador que disse receber com tranquilidade o arquivamento
do procedimento contra ele. Declarou também indignação com a denúncia contra
integrantes de seu gabinete. Em nota, Flávio disse que as transações
imobiliárias não têm ligação com os acessos ao cofre.
A reportagem procurou a defesa de Bolsonaro, mas não obteve
resposta até a publicação deste texto.
A existência de um cofre em nome de Carlos foi revelada pela
Folha de S.Paulo em setembro de 2020.
A participação de Flávio no serviço e a coincidência de
acesso com as transações imobiliárias foi divulgada em julho pelo ICL Notícias
e confirmada pela reportagem após o oferecimento da denúncia contra os
servidores do vereador.
O controle de acesso ao cofre consta no relatório da
Coordenadoria de Segurança e Inteligência (CSI) do MP-RJ. Ele oculta o nome de
Flávio, mas é possível identificar as assinaturas semelhantes ao do senador nos
documentos. Ele confirmou ser o coproprietário do serviço.
Os papéis mostram que o cofre foi acessado nos dias em que
Bolsonaro comprou as duas casas que mantém no Condomínio Vivendas da Barra.
A primeira foi adquirida em 21 de janeiro de 2009. Os
documentos do BB mostram que Carlos acessou o cofre naquele dia às 11h25 e lá
permaneceu por 20 minutos.
Como a Folha de S.Paulo revelou em janeiro de 2018, a
transação contém características suspeitas de lavagem de dinheiro pelos
critérios do Coaf.
Bolsonaro adquiriu a casa, segundo a escritura, por R$ 409
mil. Os antigos proprietários haviam comprado o imóvel quatro meses antes por
R$ 580 mil, tendo um prejuízo de R$ 171 mil na operação. Especialistas apontam
que transações do tipo podem ocorrer com pagamento "por fora", com
dinheiro vivo.
O segundo imóvel no condomínio foi adquirido em 13 de
dezembro de 2012 por, segundo a escritura, R$ 500 mil. No mesmo dia, Carlos
acessou o cofre as 10h17, tendo ficado lá por 14 minutos.
O valor de compra é menos de um quarto do avaliado pela
prefeitura para cálculos do ITBI (Imposto sobre Transmissão de Bens Imóveis). O
tributo foi cobrado sobre uma estimativa de R$ 2,23 milhões. A divergência
também é apontada como suspeita pelos critérios do Coaf.
Carlos também acessou o cofre no dia 3 de fevereiro de 2011,
mesmo dia em que o deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP) adquiriu um imóvel em
Copacabana. Ele já admitiu que pagou parte dos R$ 160 mil da operação em
dinheiro vivo.
Há também acessos em data próxima de operação suspeita
atribuída a Flávio. Segundo dados do controle do Banco do Brasil, ele acessou o
cofre no dia 26 de novembro de 2012. Um dia depois, comprou dois imóveis numa
transação com características suspeitas, também reveladas pela Folha de S.Paulo
em janeiro de 2018.
Ele adquiriu dois apartamentos em Copacabana de um mesmo
vendedor por, no total, R$ 310 mil. Um ano depois, os dois imóveis foram
vendidos com um lucro de R$ 800 mil -mais de 200%.
O MP-RJ afirmou na acusação oferecida contra Flávio ter
coletado provas que mostram que o senador pagou R$ 638 mil em dinheiro vivo
"por fora" para lavar dinheiro obtido no esquema da
"rachadinha" em seu antigo gabinete na Assembleia Legislativa. A
denúncia acabou arquivada após a anulação de provas.