"É uma forma de desestabilizar e trazer preocupações que tiram o meu foco", afirmou Bruno Calandrini à coluna sobre apuração disciplinar
Por-Rodrigo Rangel
Depois de acusar a direção da Polícia Federal de interferir
na investigação que mapeou o esquema de corrupção no Ministério da Educação e
levou à prisão do ex-ministro Milton Ribeiro, o delegado Bruno Calandrini
entrou na mira do alto comando da corporação.
Uma sindicância aberta para apurar as declarações de
Calandrini foi encerrada semanas atrás e não só concluiu que a suspeita
levantada pelo delegado não tem fundamento como propôs que um procedimento
administrativo disciplinar seja aberto contra ele. O procedimento pode resultar
até na demissão do delegado.
Nesta quinta-feira, Bruno Calandrini falou à coluna. O
delegado disse que vê “caráter perseguidor” nas medidas adotadas contra ele
pela direção da PF. Afirmou, ainda, que o procedimento disciplinar ao qual terá
de responder é uma forma de tirar seu foco da investigação sobre o MEC.
“A instauração de um procedimento administrativo concomitante
à investigação é algo que tem caráter perseguidor. É uma forma de
desestabilizar e trazer preocupações outras que tiram o meu foco”, declarou
Bruno Calandrini.
Em junho, Calandrini apontou como evidência da interferência
a decisão da direção da PF que impediu que Milton Ribeiro fosse transferido de
São Paulo para Brasília, como ele queria, sob o argumento de que não havia recursos
suficientes para custear o voo do ex-ministro e dos policiais que iriam
escoltá-lo.
A sindicância aberta a partir de então concluiu que o
delegado expôs a corporação ao falar sobre o tema em um grupo de WhatsApp e o
acusou de não planejar antecipadamente a operação — a falta de planejamento
teria sido, na visão dos dirigentes da PF, o motivo da decisão de negar a
transferência de Ribeiro.
Calandrini sustenta que, como estava atuando apenas como
investigador no caso e não tinha funções administrativas e de gestão, não era
sua atribuição organizar a operação de transferência. Quanto à mensagem de
WhatsApp na qual se queixou da interferência, o delegado afirma que a escreveu
em um grupo privado, integrado apenas por policiais, onde era comum tratar de assuntos
reservados acerca de investigações.
A apuração sobre o esquema de corrupção no MEC detonou uma
guerra interna na PF que parece longe de acabar. Após denunciar a interferência
dentro da própria corporação, Calandrini apontou indícios de que o presidente
Jair Bolsonaro alertou Milton Ribeiro sobre a investigação.
A partir daí, o Ministério Público Federal pediu que o caso
fosse remetido da primeira instância da Justica Federal em Brasília para o
Supremo Tribunal Federal e que o presidente fosse também investigado. Desde
então, a decisão de incluir Bolsonaro ou não entre os alvos da apuração está
nas mãos da ministra Cármen Lúcia.
Também em decorrência das suspeitas de interferência, Bruno Calandrini pediu que a ministra ordene a prisão da cúpula da Polícia Federal, como a coluna revelou em meados de agosto. Dias atrás, como mostrou a Globonews, o delegado intimou integrantes da direção da PF para prestarem depoimento sobre o caso.