Ao Metrópoles, especialista em agronegócio trouxe formas para realizar o escoamento da produção de forma mais eficaz
A polêmica envolvendo produtores agrícolas que foram flagrados jogando parte de sua produção no “lixo” tomou as redes sociais nas últimas semanas. A questão tomou grandes proporções devido à recente alta no preço de diversos alimentos. Mas, afinal, quais soluções podem ser tomadas pelo agronegócio para fazer o escoamento eficiente da produção e evitar o desperdício de alimentos?
Um estudo da Integration Consulting, em parceria com o Pacto
Contra a Fome — movimento suprapartidário e multissetorial que tem o
objetivo de erradicar a fome no Brasil até 2030 e reduzir o desperdício de
alimentos no Brasil — reuniu dados existentes no Relatório e o Desperdício de
Alimentos no Brasil (2022) para mapear o cenário do desperdício no país.
Desperdício no Brasil
- 161,3
milhões de toneladas de alimentos que o Brasil produz anualmente, 55,4
milhões são desperdiçadas por ano, desde o campo até à mesa.
- Ainda
segundo o relatório, os alimentos mais desperdiçados são frutas,
hortaliças, tubérculos e laticínios, correspondendo juntos a cerca de 45
milhões de toneladas de desperdício por ano.
- De
acordo com os dados, 84% do desperdício acontece antes do alimento chegar
à casa do consumidor, o que representa 47,9 milhões de toneladas.
- Dentre
os elos da cadeia produtiva, o que tem maior impacto é o produtor, com
mais de 30% do desperdício total.
- Das
55,4 milhões de toneladas de alimentos desperdiçadas, 17,3% são perdidas
na produção e colheita, 10,8 milhões na pós-colheita, armazenamento e
transporte, 11,9 milhões manufatura e abastecimento, 7,9 milhões no varejo
alimentar e serviço de alimentos e 7,5 milhões no consumidor final.
Para o pesquisador do observatório de bioeconomia da Fundação Getúlio
Vargas (FGV Bio) e FGVAgro, Eduardo Paixão, o desperdício de
alimentos, especialmente no caso de hortícolas e produtos perecíveis, está
relacionado a desafios logísticos, de armazenamento e comercialização. “Em
muitas situações, o custo do transporte acaba sendo maior do que o preço pago
ao produtor, tornando inviável o escoamento da produção”, explica.
Paixão aponta alguns caminhos que podem ser seguidos para
amenizar esse cenário de desperdício. São eles:
1. Apoio logístico e escoamento da
produção: a redução dos custos de
transporte, principalmente para produtores localizados em cinturões verdes
próximos a grandes centros urbanos, poderia facilitar o acesso aos mercados
consumidores e evitar descartes.
2. Linhas de crédito e investimentos
para infraestrutura: pequenos e médios produtores precisam de acesso facilitado a
financiamentos para construção de estruturas de armazenagem evitando perdas e
permitindo maior flexibilidade na venda dos produtos. Também são importantes os
incentivos para agroindústrias locais, que possibilitam a transformação de
produtos perecíveis em derivados de maior durabilidade, como polpas, farinhas e
conservas, ampliando seu tempo de prateleira e agregando valor à produção.
3. Expansão da rede de bancos de
alimentos: a
ampliação de iniciativas de banco de alimentos e sua integração com produtores
poderia ser uma alternativa para otimizar o aproveitamento de alimentos que não
encontram mercado imediato.
4. Modernização das compras
institucionais (PAA e PNAE): programas como o Programa de Aquisição de Alimentos
(PAA) e o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) desempenham um papel
relevante na absorção de produtos agrícolas e na segurança alimentar, mas
poderiam ser aprimorados. Um exemplo de referência é o Supplemental Nutrition
Assistance Program (SNAP) dos Estados Unidos, que utiliza um sistema
digitalizado para facilitar a gestão e a distribuição dos alimentos.
5. Organização de produtores e
contratos antecipados: o estímulo à formação de cooperativas e
associações facilita a comercialização da produção e possibilita a negociação
de contratos de fornecimento antecipado, garantindo preços previsíveis e
evitando oscilações bruscas que levem ao descarte.
6. Política de preço mínimo: expandir essa política para
mais produtos agrícolas ajudaria a proteger os produtores das flutuações do
mercado, garantindo que não precisem recorrer ao desperdício como forma de
manter preços equilibrados.
O pesquisador ainda traz que, aproximar produtores e
consumidores é uma estratégia eficiente para reduzir desperdícios e melhorar a
rentabilidade da produção agrícola. Essa aproximação pode ser feita com
plataformas digitais de venda direta, parcerias com varejo local e
restaurantes, além do fortalecimento de laços dos agricultores com feiras e
mercados locais.
“Apesar dessas alternativas, é importante considerar que a logística continua sendo um fator determinante. Mesmo com mercados locais, a viabilidade econômica para os produtores dependerá da estrutura de transporte e armazenamento disponível”, conclui Eduardo Paixão.
Da Redação