Presidente Jair Bolsonaro
Por Ricardo Kertzman
Se você está me lendo agora, com absoluta certeza, salvo alguma
exceção quase tão rara quanto ganhar na megasena, é porque pertence aos 5% mais
ricos do Brasil, ou seja, há cerca de 200 milhões de brasileiros que vivem com
menos dinheiro e possuem menos patrimônio que o(a) amigo(a) aí.
Bem, ainda que você não faça parte do 1% mais rico – o que,
diga-se, faz uma diferença gigantesca – nem muito menos dos 0.2% de super hiper
ultra mega blaster ricaços do País, acredite: você é um baita felizardo! Você
possui um teto seguro, roupas adequadas, comida, energia elétrica e saneamento
básico.
Eu sei que diante de um mundo cada vez mais materialista e
com ofertas infinitas de bens de consumo e objetos de valor, tudo isso pode não
ser o bastante. E é legítimo que seja assim, afinal, ambição e desejo por
consumo e conforto são propriedade humanas, como fome e sede, mesmo que coisas
incomparáveis.
100 MILHÕES DE BRASUCAS
Números, muitas vezes, são abstratos e não condizem com a
realidade. Quando falamos em 600 mil mortes por covid no Brasil, não
conseguimos dimensionar corretamente o que é isso e o que de fato representa
para os amigos e famílias enlutadas. Sobretudo quando estes números são
gigantes e incontáveis.
Metade do País não conhece água potável e rede de esgoto.
Metade do País vive com algum tipo de insegurança alimentar. Metade do País (em
idade escolar e pós) é considerada ou analfabeta ou analfabeta funcional.
Metade do País (economicamente ativa) está ou desempregada ou trabalhando
informalmente.
Quando digo ‘metade do País’, me refiro, no mínimo, a 100
milhões de pessoas. E por mais que você não compreenda a dimensão desse número
de seres humanos (idosos e crianças inclusive), é possível lhe garantir que se
trata de um dos piores flagelos da humanidade – sim! Eu sei que há países ainda
muito piores.
ABSORVENTE
Justamente por pertencerem aos 5% mais ricos, você (se for
mulher) e suas mães, irmãs, avós, tias, primas, etc não sabem o que é ficar
menstruadas e não terem um absorvente à mão, ou na gaveta e bolsa mais
próximas, para garantir menos desconforto. Como vivo cercado por mulheres,
conheço bem o assunto.
Mas acredite, cara leitora – e caro leitor -, há milhões de
adolescentes, jovens e adultas que não têm condições nem sequer de se vestir e
de se alimentar, quiçá comprar absorvente. O que fazem? Bem, se for inevitável
sair às ruas, improvisam com chumaços de pano ou de papel. Com alguma ‘sorte’,
miolo de pão!
Essas milhões de mulheres deixam de trabalhar – e trazer o
mínimo, quando conseguem, de comida para casa – e de estudar quando estão
menstruadas e não podem improvisar. É esse o contexto em que foi proposta e
aprovada, na Câmara e no Senado, a lei que prevê distribuição de absorventes à
população carente.
CRUELDADE INSANA
Jair Bolsonaro, cada vez mais o verdugo do Planalto, com sua
costumeira insensibilidade e, eu diria, costumeiro espírito tirânico,
simplesmente vetou a lei. Como desculpa, disse que não há previsão orçamentária
e poderia caracterizar, caso não vetasse, crime de responsabilidade e, no
limite, dar em impeachment.
O charlatão que receita e distribui medicamentos ineficazes
contra o coronavírus; o psicopata que incentiva e promove aglomerações, e prega
contra as máscaras; o homicida que sabota e boicota vacinas; o sociopata que
diz ‘e daí?’ a enlutados e ironiza um doente sufocando, não poderia mesmo agir
de outra maneira.
O cretino que gasta milhões com motociatas potencialmente
assassinas; o – no mínimo! – omisso que permite 1000% de superfaturamento; o
recordista em gastos secretos com o cartão corporativo; o oportunista que
aumenta o próprio salário; o patriarca do clã das rachadinhas está preocupado
com ‘previsão orçamentária’?
BOLSONARO SANGUINÁRIO
O amigão do Queiroz, metaforicamente e/ou não, gosta de ver
sangue. Por isso é amigo e condecora milicianos assassinos; por isso não perde
mísera oportunidade para incentivar a compra de fuzis, inclusive usando
crianças; por isso prega violência física e fuzilamento como forma de luta
contra adversários políticos.
Certamente, Freud, se vivo, explicaria a correlação entre o
psiquismo da violência (o cara simula com as mãos metralhar alguém, e depois
gargalha) e a má vontade em aprovar uma lei que impede o sangue de milhões de
mulheres de correr solto. Estou viajando? Talvez, sim. Talvez, não. Mas não é
minha ‘viagem’ que importa.
Jair Bolsonaro é, com absoluta certeza, o mais desprezível
político que o Brasil já elegeu. E eu, Ricardo, malditamente ajudei esse traste
a se tornar presidente. Me perguntam: ‘por que esse ódio todo’? Simples. O
maníaco do tratamento precoce me tornou, em alguma medida, cúmplice. Vou
carregar essa culpa o resto da vida.