O próximo presidente da Câmara pode sempre ser pior...
Hugo Motta (Foto: Kayo Magalhães/Câmara dos Deputados)Hugo Mota é um estelionatário. Mal tomou posse na presidência da Câmara ele tirou a máscara com que concorreu ao cargo e está mostrando a verdadeira cara. Como candidato, ele fugiu de compromissos programáticos e temas polêmicos, conquistando o apoio de quase todos os partidos, inclusive o do PT. Empossado, passou a ter opinião sobre tudo, a defender projetos favoráveis aos bolsonaristas e a criticar o governo Lula. Mostrando as garras, ele agora ofende o STF dizendo que não houve tentativa de golpe em 8 de janeiro e ousa questionar as penas impostas aos golpistas que já foram julgados.
Enquanto era candidato, ele se fingiu de morto ou de sonso,
evitando emitir opinião sobre temas mais polêmicos. Jurou não ter prometido ao
PL colocar em tramitação o projeto que anistia os golpistas e nem ter prometido
ao PT que congelaria o projeto, deixando de instalar a comissão especial
prevista pelo antecessor Lira para examiná-lo. Ele continua tergiversando sobre
o que fará, dizendo que ouvirá a Casa e os líderes antes de decidir, mas na
sexta-feira rasgou a fantasia ao dizer que não houve tentativa de golpe em 8 de
janeiro. Para ele, houve ataque às instituições, mas não tentativa de golpe, o
que exigiria a ação de líderes e o envolvimento de instituições.
A dedução é óbvia. Se não houve tentativa de golpe, os
participantes não podem ser condenados por isso. Logo, merecem anistia.
Hugo Motta tenta engambelar o país jogando palavras ao vento.
A Polícia Federal já demonstrou, com fartura de provas, que a tentativa de
golpe teve líderes. Apontou, entre eles, o ex-presidente Bolsonaro, seu
companheiro de chapa, general Braga Neto, seu ex-ministro da justiça, Anderson
Torres, e outros mais. E embora as Forças Armadas não tenham embarcado no
golpe enquanto instituições, a PF já demonstrou o envolvimento de militares
graduados, como o ex-comandante da Marinha, Almir Garnier. Os comandantes das
outras duas forças foram pressionados, inclusive por Bolsonaro, a participarem
do golpe, oficiais da ativa cobraram o engajamento do Alto Comando do Exército
e um general da ativa, Mario Fernandes, do alto escalão palaciano, planejou o
assassinato de Lula, de seu vice Alckmin e do ministro do STF Alexandre de
Moras.
Quando era candidato, Hugo Motta não deu um pio contra o STF.
Agora ele se permite dizer que algumas penas impostas a golpistas pelo tribunal
são “desproporcionais”. Uma mulher que apenas passava pela Esplanada não
pode ser condenada a 17 anos de prisão, disse ele distorcendo os fatos. O
Supremo absolveu dois moradores de rua que acabaram arrolados no processo, mas
contra os outros que já foram condenados, sobram provas. Sobram vídeos nítidos
e em cores. Alguns estão foragidos e tiveram até a oportunidade de firmar
acordos que reduziriam as penas.
Evitando opinar sobre temas polêmicos, na campanha Motta
recusou-se a comentar o projeto que altera a lei da ficha limpa, reduzindo de 8
para 2 anos o prazo de inelegibilidade para quem cometeu crimes de abuso do
poder político ou econômico em eleições. É o caso de Bolsonaro. Se o projeto
for aprovado, poderá permitir que ele dispute a Presidência em 2026. Poderá,
porque não é certo que a lei poderá retroagir para premiar Bolsonaro. A decisão
seria do STF.
Na sexta-feira passada, 7, Hugo Mota declarou uma rádio na
Paraíba, seu estado, que oito anos “são uma eternidade”, castigo duro demais.
Novamente, não prometeu pautar o projeto, que está na CCJ. Vai ouvir o colégio
de líderes. Todos nós sabemos que este colegiado é dominado pelos partidos do
Centrão, que incluem o Republicanos de Motta. Se ele quiser, fará a matéria
avançar.
Da mesma forma, ele nunca deu um pio sobre as propostas de
mudança do sistema de governo. O assunto, que vai e volta, agora ressurgiu em
uma PEC que acabou de ser apresentada com mais de 190 assinaturas. São
necessárias 171. Sem se comprometer, ele disse que o Brasil precisa mesmo
discutir este tema, porque o povo merece melhores governos.
Neste caso, acho que Motta devia mesmo pensar antes de se
comprometer. Muitos juristas acham que o sistema de governo não pode ser
alterado por emenda, pelo Congresso. A Constituinte de 1987/88 literalmente
rachou em relação ao tema. Os presidencialistas ganharam por pouco mas
aceitaram a realização de um plebiscito cinco anos depois, em 1993, para
confirmar a opção presidencialista. O povo a confirmou. Para muitos juristas, e
para alguns ministros do STF (pois não se conhece o pensamento de todos a respeito),
só outro plebiscito pode alterar a decisão popular de 1993.
Hugo Motta comete estelionatos eleitorais em série.
Candidato, fugiu de temas econômicos e fez elogios ao ministro Fernando
Haddad. Agora está fazendo críticas à política econômica e posando de
fiscalista. Chegou a dizer que a Câmara não aprovará mais nenhum projeto
destinado a aumentar a arrecadação. O governo que trate de gastar menos, disse
ele. Isso já sugere que o governo terás problemas para aprovar, por exemplo, o
projeto que isenta de imposto de renda os trabalhadores que ganham até cinco mil
reais, promessa de campanha que Lula quer pagar. Para compensar a perda
de receita, o governo proporá que os mais ricos paguem mais. Entre eles os que
ganham supersalários e também os que nadam de braçada com ganhos em dividendos,
aluguel, aplicações financeiras e outras mamatas.
Hugo Motta, ao tomar posse, tentou elevar a própria estatura
evocando Ulysses Guimarães, com citações e a imitação do gesto mais famoso, o
de erguer a Constituição ao proclamá-la esconjurando a ditadura. Um dos ditos
mais famosos de Ulysses é este, sempre citado: “Você diz que esse Congresso é
ruim porque ainda não viu o próximo”.
Em uma semana no cargo, Motta já nos tenta a fazer uma adaptação generosa para com Arthur Lira: o próximo presidente da Câmara pode sempre ser pior.
Da Redação