Como não lembrar o discurso de Chaplin: "Lutemos agora para libertar o mundo, abater as fronteiras nacionais, dar fim à ganância, ao ódio e à prepotência"
Trata-se do roteiro de O Grande Ditador, clássico
dos clássicos do cinema, uma sátira política de Charles Chaplin, lançado em
meio à II Guerra Mundial, no qual o genial diretor interpreta os dois
personagens, sem saber do genocídio que o mundo viria a conhecer após a
libertação do campo de concentração de Auschwitz pelas tropas soviéticas. Ao
realizar o filme, Chaplin ficou tão desconfortável que quase desistiu.
Escarneceu do autoritarismo sem se dar conta de que tudo aquilo que procurou
mostrar era muito, mas muito pior.
Chaplin satirizou as figuras de Adolf Hitler e Benito
Mussolini (no caso, Adenoid Hynkel e Benzino Napaloni, o ditador do país
Bactéria). Não perdoou os poderosos ministros Hermann Goering e Joseph
Goebbels, que no filme assumem as identidades de Herring e Garbitsch. Hynkel é
mostrado como uma criança mimada, que brinca com um globo terrestre, mais ou
menos como o novo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, está fazendo.
Como na realidade, homens e mulheres simples e humildes vivem
a penúria financeira, a intolerância e a violência de toda sorte. O barbeiro é
um alter ego de Carlitos, o vagabundo que sofre para viver em um mundo cheio de
maldade e miséria. A lavadora Hannah é a personificação da esperança. Chaplin
trouxe para o cinema falado o humor que o consagrou no cinema mudo e nos faz
duvidar dos mitos, com suas promessas de salvação e glória eterna, além de
azucrinar as paixões políticas cegas e o culto à personalidade.
A perseguição que Trump move às minorias e aos imigrantes
latinos e a forma ameaçadora como se impõe ao mundo, rompendo com toda a
institucionalidade da economia mundial, acordos comerciais e organismos
multilaterais, inclusive, em relação a aliados históricos, assombram as
chancelarias. Trump se comporta como um grande conquistador. Ameaça anexar o
Canadá, fechou a fronteira com o México, pretende comprar a Groelândia e tomar
de volta o Canal do Panamá. Agora, em plena vigência de um acordo entre Israel
e Hamas, anuncia um plano para expulsar os palestinos da Faixa de Gaza. Ou
seja, algo entre a limpeza étnica ou o puro genocídio.
Os conquistadores
O mundo já viu grandes conquistadores. Alexandre, o Grande
(356-323 a.C.), rei da Macedônia, conquistou o Império Persa e expandiu seu
domínio da Grécia até a Índia. Júlio César (100-44 a.C.), general e estadista
romano, anexou a Gália e pavimentou o caminho para o Império Romano. Genghis
Khan (1162-1227) unificou as tribos mongóis e conquistou China, Pérsia e partes
da Europa. Tamerlão (1336-1405), fundador do Império Timúrida, anexou grande
parte da Ásia Central, Pérsia, Índia e Oriente Médio. Carlos Magno (742-814),
rei dos Francos, expandiu seu império pela Europa Ocidental e fundou o Sacro
Império Romano-Germânico.
Nos tempos mais modernos, Fernão Cortez (1485-1547), a
serviço dos reis de Espanha, conquistou o Império Asteca. Francisco Pizarro
(1478-1541) derrotou o Império Inca e expandiu o domínio espanhol na América do
Sul. Napoleão Bonaparte (1769-1821) dominou grande parte da Europa. Satirizado
por Chaplin, Adolf Hitler dominou a maior parte da Europa e acabou com a
Alemanha derrotada e dividida. Todos eram mortais e seus impérios desmoronaram.
Alexandre morreu doente ou envenenado na Babilônia. Júlio
César (100-44 a.C.) foi esfaqueado 23 vezes por senadores romanos, incluindo
seu sobrinho Brutus. Genghis Khan caiu do cavalo. Tamerlão, de febre, na China.
Carlos Magno, de infecção nos pulmões em Aachen (Alemanha). Cortez, de
disenteria na Espanha. Pizarro, assassinado por rivais espanhóis em Lima, no
Peru. Napoleão, de câncer ou envenenamento, confinado na Ilha de Santa Helena,
no meio do Atlântico Sul. Hitler se matou na queda de Berlim. Seu corpo foi
carbonizado pelos subordinados e suas cinzas foram espalhadas pelos soviéticos.
Como não lembrar o discurso de Chaplin no final de O
Grande Ditador: "Lutemos agora para libertar o mundo, abater as
fronteiras nacionais, dar fim à ganância, ao ódio e à prepotência. Lutemos por
um mundo de razão, um mundo em que a ciência e o progresso conduzam à ventura
de todos nós."
Da Redação