Caminhoneiros mantinham paralisações em 15 Estados na manhã
desta quinta-feira, mesmo após a divulgação na noite da véspera de um áudio do
presidente Jair Bolsonaro pedindo a desmobilização do movimento e a liberação
dos locais onde há bloqueio.
A autenticidade da fala de Bolsonaro, que tem nos
caminhoneiros importante base de apoio, foi confirmada pelo ministro da
Infraestrutura, Tarcísio Gomes de Freitas.
De acordo com boletim divulgado pelo Ministério da
Infraestrutura às 8h30 no Twitter, havia registro de concentração em 15 Estados
e, segundo a pasta, não havia interdição de pista na malha rodoviária federal,
exceto pelo causado por um protesto pela causa indígena na BR-174, em Roraima.
Na rodovia Régis Bittencourt, na altura de Embu das Artes
(SP), caminhoneiros bloquearam completamente a pista por volta das 3h, mas o
tráfego foi liberado às 7h30.
De acordo com o ministério, as concentrações de caminhoneiros
aconteciam em Santa Catarina, Rio Grande do Sul, Paraná, Espírito Santo, Mato
Grosso, Goiás, Bahia, Minas Gerais, Tocantins, Rio de Janeiro, Rondônia.
Maranhão, Roraima, Pernambuco e Pará.
Na noite de quarta, Bolsonaro enviou áudio pedindo que seus
apoiadores desmobilizassem os protestos, alegando que a manifestação poderia
agravar a alta da inflação e a situação econômica já frágil do país --a crise
tem se refletido nos índices de popularidade do presidente apontados em
pesquisas de opinião.
"Fala para os caminhoneiros aí, são nossos aliados, mas
esses bloqueios aí atrapalham a nossa economia, isso provoca desabastecimento,
inflação. Prejudica todo mundo, especialmente os mais pobres. Então dá um toque
aí nos caras, se for possível, para liberar, tá ok, para a gente seguir a normalidade",
disse o presidente em um áudio enviado por mensagem a interlocutores da
categoria.
Pouco depois, em vídeo divulgado nas redes sociais, o
ministro da Infraestrutura, Tarcísio de Freitas, confirmou a autenticidade do
áudio de Bolsonaro.
"O áudio é real, é de hoje, e mostra a preocupação do
presidente com a paralisação. Essa paralisação ia agravar efeitos na economia
de inflação que ia impactar os mais pobres, os mais vulneráveis", disse
Tarcísio.
"A gente sabe que há uma preocupação de tentar resolver
problemas graves no país, mas a gente não pode tentar resolver um problema
criando outro. Eu peço a todos que ouçam atentamente a palavra do
presidente", acrescentou.
Entretanto, na Régis Bittencourt, o bloqueio seguiu até 7h30
desta quinta. Caminhoneiros que não participavam do movimento foram obrigados a
parar sob ameaça de danos aos veículos e tiveram os pneus furados para que
permanecessem no local, onde seguiram mesmo após a liberação do tráfego. Seis
viaturas da Polícia Rodoviária Federal acompanharam a paralisação.
O áudio do presidente não foi suficiente para sensibilizar as
lideranças que protestaram na rodovia federal paulista.
"Primeiro que ele como presidente da nação não poderia
tomar partido, até porque prejudicaria o nosso próprio movimento. O nosso
movimento é livre, são pais de família e mães de família aqui, da área do
caminhão, da área da agricultura, que decidiram parar porque não aguentam
mais", disse a caminhoneira Claudia Isabel, que participava do bloqueio na
Régis Bittencourt.
"Não é porque ele (Bolsonaro) falou ou deixou de falar,
a gente está lutando por um país melhor."
Os caminhoneiros reclamavam do preço dos combustíveis e
concordavam com versão constantemente ventilada por Bolsonaro de que o ICMS, um
imposto estadual, é o principal responsável pela alta.
Prejuízos
Motoristas que não fazem parte do movimento foram coagidos a
parar na estrada sob ameaças.
"Na verdade me obrigaram a parar aqui. Aí furaram o meu
pneu e estou aqui esperando chegar o socorro", disse Bruno Rodrigo dos
Santos, na Régis Bittencourt.
"Eu estou revoltado, se fosse uma paralisação que
tivesse algum benefício, mas não, estão prejudicando os próprios irmãos de
estrada. Estão deixando a gente no prejuízo, isso não é uma coisa certa de se
fazer, se fosse para fazer, que fosse pacífico."
No Rio de Janeiro, havia pontos de concentração de
caminhoneiros nesta manhã, mas sem bloqueios, na altura do km 75 da BR-101, em
Campos dos Goytacazes, no km 13 da BR-465 e no km 113 da BR-040, em frente à
refinaria Duque de Caxias (Reduc), onde os caminhoneiros ameaçam bloquear a
estrada mais tarde nesta quinta. A Polícia Rodoviária Federal acompanha as
concentrações.
Além disso, em Brasília, caminhões permaneciam na Esplanada
dos Ministérios após os protestos com pautas antidemocráticas realizados no
feriado do Dia da Independência, no 7 de Setembro, e a Polícia Militar do
Distrito Federal negociava a retirada dos veículos, por ora, sem sucesso.
Os protestos dos caminhoneiros, aliados do governo Bolsonaro,
começaram um dia depois das manifestações do 7 de Setembro, quando o presidente
renovou os ataques ao Supremo Tribunal Federal e ameaçou a corte com uma
ruptura.
Para além das pautas colocadas pelo próprio presidente
--impeachment do ministro do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes e
defesa do voto impresso-- os caminhoneiros colocaram também as suas, centradas
na queda do preço dos combustíveis.
Em redes bolsonaristas, aparecem várias manifestações contra
o preço dos combustíveis, mas comprando a versão de Bolsonaro, de que o alto
custo seria culpa basicamente do ICMS, imposto cobrado pelos Estados.
No áudio enviado na noite de quarta, Bolsonaro diz ainda que
cabe a ele negociar com autoridades para resolver o problema da categoria, mas
não cita especificamente o preço dos combustíveis.
“Deixa com a gente aqui em Brasília agora. Não é fácil
negociar, conversar por aqui com outras autoridades, mas a gente vai fazer a
nossa parte, vamos buscar uma solução para isso, tá ok? E aproveita aí e da um
abraço em meu nome em todos os caminheiros, tá ok?”, disse o presidente.
Entretanto, apoiadores de Bolsonaro em grupos nas redes
sociais afirmavam que o pedido do presidente no áudio era apenas protocolar,
pois ele não poderia pela força do cargo apoiar o movimento abertamente, e que
as manifestações deviam continuar.
Antes de se tornar mais um risco para o governo, o movimento dos caminhoneiros foi usado por bolsonaristas como o cantor Sérgio Reis como uma ameaça de parar o país para que reivindicações do grupo fossem atendidas. Em um vídeo, Reis foi filmado dizendo que os caminheiros iriam parar o país até que o Senado aceitasse o impeachment de Alexandre de Moraes.