Com discurso radical ao gosto dos seus devotos, o presidente acabará sendo derrotado
Por-Ricardo NoblatAssombra Bolsonaro o que aconteceu com a ex-presidente da
Bolívia, Jeanine Añez, condenada à prisão por tramar um golpe de Estado, em
2019. Foi o que ele mesmo admitiu em entrevista a jornalistas brasileiros à
saída de uma churrascaria, ontem à tarde, em Orlando, nos Estados Unidos:
“A turma dela perdeu [as eleições], voltou a turma do Evo
Morales [ex-presidente, deposto por um golpe militar]. O que aconteceu um ano
atrás? Ela foi presa preventivamente. E agora foram confirmados 10 anos de
cadeia para ela. Qual a acusação? Atos antidemocráticos. Alguém faz alguma
correlação com Alexandre de Moraes e os inquéritos por atos antidemocráticos?
Ou seja, é uma ameaça para mim quando deixar o governo?”
Alexandre de Moraes, ministro do Supremo Tribunal Federal,
chefia, ali, um inquérito que investiga a rede bolsonarista de distribuição de
notícias falsas e de financiamento de atos hostis à democracia. Bolsonaro, que
uma vez o chamou de “canalha”, agora sugeriu que Alexandre é “um psicopata”:
“Isso nunca ocorreu no Brasil. Uma pessoa apenas decide. Ele
faz um inquérito, que não tem a participação do Ministério Público, e investiga
por fake news. O que esse cara tem na cabeça? O que é que ele está ganhando com
isso? Quais são seus interesses? Ele está ligado a quem? Ou é um psicopata? Ele
tem um problema.”
Bolsonaro voltou também a atacar o ministro Luís Roberto
Barroso, chamando-o de “mau caráter” e “mentiroso”. Desta vez deixou em paz o
ministro Edson Fachin, presidente do Tribunal Superior Eleitoral, a quem acusa
de ser “marxista e leninista”, mas não a Lula, que acusou de ser corrupto.
Sobre urnas eletrônicas? Voltou a falar em risco de fraudes
caso os militares não possam participar de modo mais ativo da apuração dos
votos. Lamentou que o tribunal tenha rejeitado ofício que lhe enviou o Ministério
da Defesa pondo em dúvida o sistema eleitoral. Para variar, Bolsonaro mentiu. O
tribunal não rejeitou o ofício.
Das 15 propostas feitas pelas Forças Armadas, 10 foram
acolhidas, quatro estão em análise para as eleições de 2024, e apenas uma de fato
foi rejeitada. Bolsonaro não se emenda. Seus auxiliares da área política
comemoravam os efeitos positivos de sua viagem aos Estados Unidos quando
souberam o que ele disse em Orlando.
Se dependesse deles, Bolsonaro pararia de atacar ministros do
Supremo e de pôr em dúvida a segurança das urnas. Ele está 21 pontos atrás de
Lula em recente pesquisa Datafolha. Seu principal objetivo deveria ser atrair
votos do centro, e isso só será possível se ele moderar o discurso. Do jeito
que vai, acabará derrotado.